13.11.2010 - A nova exortação apostólica do Papa Bento XVI – de título Verbum Domini – foi publicada no dia de hoje no site da Santa Sé. Apesar de não haver tido a oportunidade de ler o documento inteiro, comento a introdução da carta, que já é um trecho cujo conteúdo é deveras riquíssimo.
Sua Santidade já inicia a exortação se referindo ao mistério de Deus que se faz homem, ao Deus que interfere diretamente na história humana: “Vemo-nos colocados diante do mistério de Deus que Se comunica a Si mesmo por meio do dom da sua Palavra. Esta Palavra, que permanece eternamente, entrou no tempo. Deus pronunciou a sua Palavra eterna de modo humano; o seu Verbo ‘fez-Se carne’ (Jo 1, 14)” (n. 1). Parece estranho aos olhos do homem do século XXI contatar-se com esta realidade tão incrível de Amor. Com efeito, a visão deísta acerca de Deus, triste herança herdada do iluminismo, parece ganhar muita força na sociedade moderna. Voltaire concebia Deus como um mero relojoeiro, se mantinha indiferente diante do conceito de Revelação. Não são raras, também hoje, as pessoas que questionam o conteúdo da Verdade revelada. Para estas, o Altíssimo não seria nada mais que um grande Arquiteto do Universo. Ele é a Inteligência que dá impulso à Criação, mas seria Inteligência fria que se retira e entrega o ser humano à própria sorte. O que o Papa está querendo nos mostrar, logo no começo deste novo documento, é que “Deus não é uma hipótese remota, não é um desconhecido que se retirou depois do big bang. Deus mostrou-Se em Jesus Cristo” (Carta aos Seminaristas, n. 1). Quando nos colocamos diante da Sagrada Escritura, estamos prestes a ler o testemunho de pessoas que viram, elas mesmas, o Amor preocupado de Deus para com suas criaturas. Um Amor que cria, mas que, por se compadecer da miséria da raça humana pecadora, decide realizar uma nova Criação (cf. Ef 2, 10). Todos nós somos convidados a participar desta belíssima realidade. Todos somos chamados a ver no rosto de Jesus o rosto do próprio Deus.
E por que o Papa convida novamente os homens a buscarem a Cristo e ao Seu Evangelho? Ora, poderia, por acaso, ficar o sucessor de Pedro indiferente à alegria que brota do encontro pessoal com a pessoa de Jesus Cristo, que é o próprio Verbo de Deus feito Homem? “É dom e dever imprescindível da Igreja comunicar a alegria que deriva do encontro com a Pessoa de Cristo, Palavra de Deus presente no meio de nós. Num mundo que frequentemente sente Deus como supérfluo ou alheio, confessamos como Pedro que só Ele tem ‘palavras de vida eterna’ (Jo 6, 68). Não existe prioridade maior do que esta: reabrir ao homem atual o acesso a Deus, a Deus que fala e nos comunica o seu amor para que tenhamos vida em abundância” (n. 2). O homem tem buscado incessantemente a felicidade, mas não tem encontrado, e justamente porque deseja beber na fonte da morte a água que dá a Vida. Ora, sabemos bem que é impossível achar naquilo que está contaminado um sinal de santidade; sabemos bem que é impossível encontrar na tristeza mortal que é o afastamento da vontade de Deus a verdadeira alegria. O homem precisa redescobrir o sentido do Cristianismo. Com efeito, esta não é uma religião cujos dogmas representam um pesado fardo a ser carregado. Reduzir a mensagem do Evangelho a isto é traduzir uma prática religiosa fria, é excluir a beleza de um contato interior profundo com o Altíssimo, é excluir a piedade e o fervor que brotam em nosso coração graças à participação no sacramento da Eucaristia, fonte e ápice da vida cristã. O Cristianismo é a religião da Alegria, pois é o encontro com Aquele que é o único Caminho que conduz à vida eterna.
E este encontro se dá na medida em que cremos que a nossa razão, limitada, não é o único meio do qual gozamos para chegar à verdade. “A Igreja confessa, incessantemente, a cada geração que Ele, com toda a sua presença e manifestação da sua pessoa, com palavras e obras, sinais e milagres, e sobretudo com a sua morte e gloriosa ressurreição e, enfim, com o envio do Espírito de verdade, completa totalmente e confirma com o testemunho divino a Revelação” (n. 3). Por que é o cúmulo da insanidade que até teólogos, contaminados por uma forma totalmente herética de fazer Teologia, neguem a verdade da Ressurreição? Os ataques a esta verdade que possui um forte testemunho bíblico são mentiras que foram tramadas com uma finalidade clara: destruir a fé do povo cristão na Revelação divina. Com a morte de Cristo, parece que todas aquelas coisas que Ele havia ensinado também tinham morrido no coração dos Apóstolos. O que os impulsiona a manter acesa em seus corações a mensagem da boa nova é justamente a verdade da Ressurreição, pois é a intervenção visível do Sobrenatural na história, é o milagre da Vida que não pode permanecer morta. Quando um teólogo da libertação, então, afirma que não houve Ressurreição, que, na verdade, aquilo no qual os apóstolos tinham fé nada mais era que um corpo aparente, a facilidade de deixar-se conduzir pelo “só podemos chegar à Verdade pelo uso da razão natural” cresce, e a tendência é que dogmas como a Santíssima Trindade, a virgindade perpétua de Maria e outras tantas riquezas eclesiais sejam simplesmente desprezadas.
Precisamos voltar a exaltar aquilo que é transcendente no Cristianismo. De valorizar a razão qualquer deísta amante do pensamento iluminista é capaz. O que precisamos é resgatar a fé na Revelação, no escândalo de amor do Deus que se encarna para salvar o gênero humano. Nos ajude nesta grande obra de evangelização a Virgem Maria, mãe da Verdade, mulher escolhida pelo Altíssimo para portar em seu ventre Aquele que é a propiciação pelos nossos pecados.
Graça e paz.
Salve Maria Santíssima!