04.10.2010 - Em matéria da revista Time desta semana, as mulheres estão reivindicando o direito de serem reconhecidas como sacerdotisas pelo papa romano. “Desafiando o Vaticano, as mulheres católicas Reclamam sacerdócio” é o título-traduzido da reportagem.
“Como qualquer bom padre, Judy Lee sabe como usar uma história da Bíblia. Uma das leituras de missas católicas em um domingo recente, a partir do Livro da Sabedoria, relata como os hebreus desafiaram o faraó adorando a Deus “em segredo”. Essa passagem ecoa em uma casa em Fort Myers, na Flórida, onde Lee está realizando missa para 25 católicos que se reuniram na frente de um ‘altar’, desafiando o papa.
“Roma diz que você vai ser expulso da igreja por estar aqui”, diz Lee, “porque eu sou uma mulher.” Aos 67 anos, ela se considera um padre católico ordenado validamente. O Vaticano não concorda. “A Igreja Católica [...] não tem autoridade para conferir a ordenação sacerdotal às mulheres”, porque Jesus não tinha apóstolos femininos, disse à Lee em uma carta o bispo local, o reverendo Frank Dewane – que também informou que ela havia sido excomungada por ignorar essa doutrina.
Em resposta, ela disse: “Roma pode impor todas as regras que quiser às mulheres, aos divorciados, homossexuais e a nós. Mas ela não pode impedir”.
Ela e mais de 100 outras mulheres que pretendem ser padres católicos nos EUA e no exterior podem agradecer a igreja por uma coisa: a resposta da Igreja ao movimento delas – em julho, o Vaticano classificou ordenação feminina um ‘gravius delictum’ ou crime grave, o mesmo rótulo da pedofilia – suscitou a atenção o suficiente para levantar seu perfil fora das catacumbas”.
Veja noticia original em Inglês abaixo
http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,2019635,00.html
Fonte: http://www.comshalom.org
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Nota de www.rainhamaria.com.br
As ordenações sacerdotais de mulheres
Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
Autor: Estevão Bettencourt, Osb.,
Nº 209, - Ano 1977, Pág. 202.
Em síntese: Nos últimos decênios tem-se posto com insistência, entre os cristãos, a questão do sacerdócio ministerial de mulheres. À diferença do que acontece no luteranismo e no anglicanismo, a Igreja Católica e as comunidades eclesiais ortodoxas do Oriente têm rejeitado a perspectiva do sacerdócio feminino. Em outubro de 1976, a S. Congregação Romana para a Doutrina da Fé publicou uma Declaração dita “Inter insigniores” que propõe as razões por que a Igreja Católica não adota a nova tese: o exemplo de Cristo, o dos Apóstolos, a praxe constante da Tradição cristã, o próprio mistério de Cristo e o da Igreja levam a dizer que não esta em poder da Igreja hoje estender a ordenação sacerdotal ao sexo feminino.
A grandeza e a importância da mulher têm sido mais e mais reconhecidas na Igreja e na sociedade contemporânea. O catolicismo valoriza altamente a função da mulher; lembra, porém, que “os maiores no Reino dos céus não são os ministros, mas, sim, os santos”; e o que faz os santos, é a caridade ou o amor perfeito. Que todos, homens e mulheres, exercendo cada qual a sua função própria e inconfundível na Igreja, cultivem a caridade, evitando divisões e rixas por causa dos ministérios a ser exercidos. Nem se diga que o sacerdócio ministerial é direito da mulher, visto que o batismo não confere nenhum titulo pessoal ao ministério público na Igreja. Esta, de resto, não é simplesmente uma sociedade como outra qualquer, mas é um sacramento, uma realidade sobrenatural, cujos critérios não são puramente sociológicos ou psicológicos, mas os da fé transmitida pelas Escrituras e a Tradição,m que o magistério da Igreja propõe autenticamente em cada uma das fases da história.
Comentário: Sabe-se que, aos 15/X/1976, a S. Congregação para a Doutrina da Fé publicou uma Declaração sobre a admissão de mulheres ao sacerdócio ministerial. Este documento veio dirimir uma questão calorosamente discutida nos últimos tempos o movimento feminista ascendente dava a crer que a Igreja Católica resolveria conferir a ordenação sacerdotal às mulheres. Isto, porém, não aconteceu. Vista a importância desta atitude de reserva da Igreja, procuraremos abaixo transmitir as grandes linhas da citada Declaração e os argumentos a que ela recorre.
Logo de início, notemos o que os comentadores do documento observam muito oportunamente: a Declaração deveria ter sido inserida no contexto de um estudo mais amplo sobre a questão da promoção da mulher no mundo de hoje. Assim o caráter negativo da Declaração teria sido diluído dentro de perspectivas grandiosas. Contudo ainda não se pode propor um estudo completo da promoção da mulher hoje, visto que muitas das pesquisas empreendidas sobre o assunto ainda estão em curso. De outro lado, não era oportuno protelar uma Declaração pública da Igreja sobre o sacerdócio das mulheres, dado que a questão era agitada dentro e fora do Catolicismo. É o que explica tenha sido publicado recentemente um documento que apenas diz Não, sem mostrar o relevante papel da mulher na Igreja e no mundo. Seja, porém, considerado à luz da estima que a Igreja e a sociedade de nossos tempos têm tributado à mulher.
A Declaração compreende seis partes: 1) o fato da Tradição; 2) a atitude de Cristo; 3) a prática dos Apóstolos; 4) o valor permanente da atitude de Jesus e dos Apóstolos; 5) a luz do mistério de Cristo; 6) a luz do mistério da Igreja. - A primeira parte está praticamente incluída na terceira e na quarta.
1. A atitude de Cristo
Observa-se que Jesus não chamou mulher alguma a fazer parte do grupos dos doze Apóstolos. Procedeu assim não por tencionar conformar-se aos costumes sociais de seu tempo, pois na verdade Jesus teve, em relação às mulheres, atitudes que rompiam corajosamente com os hábitos dos seus contemporâneos.
Com efeito, o Senhor fazia-se acompanhar em suas viagens não só pelos doze, mas também por um grupo de mulheres (cf. Lc 8, 2s). Quais que as mulheres fossem, para os Apóstolos, as mensageiras da sua ressurreição (cf. Mt 28,7-10; Lc 24, 9s; Jo 20,11-18), embora o Direito judaico pouco valor reconhecesse à palavra das mulheres. Perdoando à mulher adúltera, Jesus quis mostrar que não se deve ser mais severo para com a mulher do que para o homem (cf. Jo 8,11).
Estes e outros dados evangélicos não são, por si mesmos, argumentos decisivos. Hão de ser considerados à luz de toda a Tradição da Igreja, que viu na atitude de Jesus uma orientação decisiva para determinar o sujeito do sacramento da Ordem. Essa Tradição foi a mesma tanto no Ocidente como no Oriente; tal unanimidade é digna de nota especial, visto que em outros pontos não se verificou; até hoje, aliás, tanto os cristãos orientais como os ocidentais recusam o sacerdócio às mulheres, tencionando assim ser fiéis ao modelo de ministério intencionado pelo Senhor e fielmente mantido pelos Apóstolos.
De resto, é de se notar que, embora Maria SS. tenha sido intimamente associada ao mistério de Cristo, desempenhando função sem par, não foi investida do ministério sacerdotal. Este fato foi tido como altamente significativo na teologia católica. Assim, por exemplo, escrevia o Papa Inocêncio III (+ 1216):
“Ainda que a bem-aventurada Virgem Maria ultrapasse em dignidade e excelência todos os Apóstolos, não foi a ela, mas a estes que o Senhor confiou as chaves do Reino dos Céus” (Epístola de 11/XII/1210) aos bispos de Palvência e Burgos).
Aliás, desde o século III os escritores da Igreja lembram o fato de que Maria, tão exaltada como foi pelo Senhor Deus, não recebeu a ordenação sacerdotal. O lugar de Maria, no plano de Deus, é único; Ela não deve ser comparada aos Apóstolos, pois está acima deles. Isto bem mostra que na Igreja há funções diferentes: se, de um lado, não há acepção de pessoas diante de Deus, de outro lado existe complementação de tarefas; o ministério sacerdotal não é a única forma de dignidade, mas é uma maneira de servir entre outras. Maria SS. não precisa do “acréscimo de dignidade” que certos autores de espiritualidade lhe quiseram atribuir, chamando-a “Virgem Sacerdotiza”.
2. A praxe dos Apóstolos
O colégio dos Apóstolos permaneceu fiel ao Senhor Jesus. Embora Maria fizesse parte do círculo daqueles que aguardavam o dom do Espírito após a ascensão do Senhor, não foi chamada a entrar no colégio apostólico quando os apóstolos elegeram Matias; somente os nomes de José Barsabas e Matias foram então propostos (cf. At 1, 23-26). Embora tivesse recebido o Espírito Santo em Pentecostes, o anúncio da Boa-Nova foi executado por “Pedro e os onze” (cf. At 2,14).
Quando os Apóstolos foram pregar fora do mundo judaico, tiveram que romper com as tradições da Lei de Moisés - o que foi feito pelo Apóstolo São Paulo de maneira enérgica e decidida. Os Apóstolos poderiam então ter considerado também a possibilidade da ordenação de mulheres, pois no mundo helenístico o culto de várias divindades pagãs era confiado a sacerdotizas; de resto, embora os filósofos menosprezassem a mulher, houve certo movimento de promoção feminina durante o período imperial.
Ora o que se lê no livro dos Atos dos Apóstolos e nas cartas paulinas, é que os Apóstolos tiveram a colaboração de mulheres em sua obra evangelizadora; cf. Rm 16,3-12; Fl 4,3. Algumas em certos casos de conversão; Febe foi diaconisa da Igreja de Cencréia (cf. Rm 16,1). Estes fatos evidenciam que no tempo dos Apóstolos se deu uma evolução em relação ao judaísmo no modo de tratar as mulheres, mas nem por isto houve ordenação sacerdotal de mulheres.
3. Valor permanente de tais atitudes
Os textos bíblicos foram tomados como norma pela Igreja de todos os tempos, que por isto jamais conferiu o ministério sacerdotal a mulheres. Eis, porém, que em nossos dias alguns pensadores julgam que a Igreja poderia mudar a sua praxe neste particular.
Ponderemos os seus argumentos:
1) A atitude de Jesus explicava-se pela infância do seu ambiente e da sua cultura; a mulher em tal contexto não era valorizada. Por conseguinte, as circunstâncias históricas não permitiam ao Senhor agir de outro modo.
A esta observação pode-se responder o seguinte: seria preciso demonstrar que a atitude do Senhor se inspirava unicamente em motivos sócio-culturais. Ora é fato notório que Jesus rompeu com preconceitos de seu tempo, não observando certas discriminações impostas às mulheres. Por conseguinte, é difícil ou arbitrário sustentar que, não chamando mulheres para o colégio dos Apóstolos, o Senhor se tenha tão somente conformado aos usos do seu tempo.
2) Afirma-se que certas prescrições do Apóstolo São Paulo em relação às mulheres tinham caráter transitório; hoje seriam incompreensíveis; tal é, por exemplo, a que se refere ao uso de véu por parte das mulheres nas assembléias de culto (cf. 1 Cor 11,2-16). Observe-se também a imposição de silêncio e de submissão às mulheres por ocasião dos atos litúrgicos (cf. 1Cor 14,34; 1Tm 2, 12). Se, pois, o Apóstolo tomou atitudes de caráter transitório em relação às mulheres, pergunta-se: por que insistir no procedimento do Apóstolo para excluir do sacerdócio ministerial as mulheres?
- A esta argumentação pode-se responder que a prescrição do Apóstolo relativa ao uso do véu das mulheres é sim, questão de cultura e de época. Quanto ao falar na Igreja, note-se que o Apóstolo não se opõe a que as mulheres exerçam o dom da profecia nas assembléias (cf. 1Cor 11,5) ¹; o que parece não ser da intenção do Apóstolo, é que as mulheres assumam a função oficial e hierárquica de ensinar a mensagem revelada, pois essa função supõe a missão recebida de Cristo pelos Apóstolos e transmitida por estes aos seus sucessores. Vale a pena lembrar, porém, que, apesar disto, a Igreja julgou poder atribuir o título de “Doutora” a Santa Teresa de Ávila e a Santa Catarina de Sena, como o atribuiu a grandes mestres de Teologia (S. Alberto Magno, S. Lourenço de Brindisi...). A proibição, segundo o Apóstolo, prende-se formula: “A cabeça de todo homem é Cristo, a cabeça da mulher é o homem” (1Cor 11,3. 8-12; Ef 5,22.24). Essa primazia ou chefia do homem em relação à mulher é entendida pelo Apóstolo não como domínio, mas como doação que chega ao sacrifício do próprio homem; cf. Ef 5,25-33. De resto, é a São Paulo que devemos um dos textos que mais enfaticamente incutem a igualdade fundamental do homem e da mulher: “Não há judeu nem negro, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,28). Estes dizerem bem mostram quanto o Apóstolo era livre e dilatado em seu modo de pensar.
A esta altura convém mencionar outrossim o fato, muito citado pelos arautos da nova tese, de que algumas abadessas na Idade Média exerceram atos de jurisdição, normalmente reservados aos bispos, como são a nomeação de párocos ou de confessores. Ora tais atos foram, em grau mais ou menos explícito, reprovados pela Santa Sé em diversas épocas; ainda hoje tem-se uma carta de advertência do Papa Inocêncio III (+ 1216) à abadessa de Huelgas. De resto, é notório que também os senhores feudais arrogavam a si o direito de exercer certa jurisdição na Igreja. Justificando essa praxe, os canonistas da época admitiam que a jurisdição pudesse ser separada do sacramento da Ordem - o que hoje não é aceito.
3) Os que preconizam a ordenação das mulheres, lembram que a Igreja, no decorrer dos séculos, exerceu certo poder sobre a disciplina dos sacramentos; como testemunhos recentes deste poder, citam-se as intervenções de Pio XII no ritual do sacramento da Ordem e as de Paulo VI nos da Crisma e da Unção dos Enfermos.
- Não há dúvida, a autoridade da Igreja tem modificado aspectos do Sacramentário, nunca, porém, alterando o essencial dos sacramentos instituídos por Cristo. Os sinais sacramentais não são meramente convencionais; eles devem exprimir a sua relação com os acontecimentos iniciais do Cristianismo e com o próprio Cristo. Ora a questão da ordenação das mulheres toca de muito perto o sacerdócio ministerial; não pode ser tida como aspecto acidental do sacramento da Ordem.
Em última instância, como se vê, é o magistério da Igreja quem define o que é essencial e o que é acidental na praxe litúrgica e jurídica dos cristãos. E a Igreja exerce tal magistério porque sabe que lhe foi confiado por Cristo, que lhe assiste, a fim de que o depósito da Revelação Divina seja conservado incólume apesar das vicissitudes humanas. É o que professa a Declaração em foco:
“Se a Igreja julga que não pode aceitar certas mudanças, isto ocorre porque Ela se sente ligada pelo procedimento de Cristo; a sua atitude então, não obstante as aparências, não é de arcaísmo, mas, sim, de fidelidade; somente sob esta luz pode ser compreendida essa sua atitude. A Igreja pronuncia-se em virtude da promessa do Senhor e da presença do Espírito Santo, com a finalidade de melhor proclamar o mistério de Cristo e de salvaguardar melhor e manifestar integralmente a riqueza do mesmo” (Declaração nº 4).
Passemos agora a novo item da Declaração: 4. ... À luz do mistério de Cristo
1. É constante doutrina da Igreja que o sacerdote, no exercício do seu ministério, não age em seu próprio nome, mas representa o Cristo, que por ele age; cf. 2Cor 5,20; Gl 4, 14. Esta função se evidencia muito especialmente quando o sacerdote pronuncia as fórmulas sacramentais: “Eu te absolvo dos teus pecados... Isto é o meu corpo”. Se, pois, o sacerdote é uma representação ou um sinal do Cristo, pelo qual Cristo mesmo age, conclui-se que deve haver semelhança natural entre Cristo e seu ministro. Ora Cristo é Deus, que assumiu a natureza humana do varão de maneira inconfundível e indelével. Isto não quer dizer que o varão seja superior à mulher (o que São Paulo nega; cf. Gl 3, 28), mas é uma questão de fato, que repercute em toda a dispensação da salvação.
O desígnio de Aliança, que é característico das Escrituras Sagradas, é simbolizado pela Bíblia como aliança nupcial; O Senhor Deus aparece como esposo e a virgem de Israel ou filha de Sion como esposa; cf. Os 1-3; Jr 2. Conseqüentemente Cristo é apresentado como o Esposo da Igreja ou da natureza humana; cf. 2Cor 11,2; Ef 5,22-33; Jo 3,29; Ap 19,7-9. Na linguagem do Evangelho, Cristo é o Filho de um Rei para quem o Rei ou o Pai quis preparar uma festa de núpcias (cf. Mt 22, 1-14). É, pois, através de simbolismo que atinge a identidade íntima do homem e da mulher, que nos é revelado o mistério de Deus e de Cristo. A imagem da Aliança - e da Aliança nupcial - está tão arraigada nas Escrituras que não pode ser preterida; ela tem seu valor inconfundível na revelação do amor de deus. Conclui, pois, a Declaração:
“É por isto que não se pode transcurar o fato de que Cristo é um homem. E, portanto, a menos que se queira ignorar a importância de tal simbolismo para a economia da Revelação, será preciso admitir que naquelas ações que exigem o caráter da ordenação e em que é representado o próprio cristo, autor da Aliança, Esposo e Chefe da Igreja, a exercer o seu ministério de salvação - como sucede em mais alto grau no caso da Eucaristia -, o seu papel há de ser desempenhado (é este o significado primigênio da palavra persona) por um homem; isto não significa haja superioridade pessoal na ordem dos valores, mas tão somente diversidade de fato, ao nível das funções e do serviço”.
2. Eis, porém, que alguém dirá: na atual condição celeste em que se acha, Cristo é indiferente a ser representado por um homem ou por uma mulher, visto que “na ressurreição nem os homens terão esposa, nem as mulheres terão marido” (cf. Mt 22,30). Se a Igreja admite que homens de todas as raças possam representar validamente o Cristo (que foi de raça semita), por que não admitiria que pessoas de sexo feminino O possam representar ?
- A esta observação diga-se o seguinte: a distinção entre homem e mulher, na medida em que determina a identidade própria da pessoa, não será supressa na glória celeste; o que não ocorrerá, será tão simplesmente o uso das funções sexuais, que são correlativas à reprodução e ao caráter peregrino da humanidade. Note-se outrossim que, conforme a biologia e a psicologia modernas, as diferenças sexuais ainda são mais profundas e marcantes do que as diferenças entre raças, pois marcam todas as células da pessoa humana; tão profundas diferenças (que não significam contraste, mas complementação), o próprio Deus as quis, como refere Gn 1,27: “deus... criou-os homem e mulher”.
3. Ainda se poderia redargüir: mas o sacerdote, quando preside às ações litúrgicas e sacramentais, representa igualmente a Igreja e age em nome desta, “tendo a intenção de fazer o que faz a Igreja”.
- É preciso, sem dúvida, reconhecer a veracidade desta afirmação: o sacerdote representa a Igreja, que é o Corpo de Cristo. No entanto, Ele só o faz porque, em primeiro lugar, representa o próprio Cristo, que é o Cabeça e Pastor da Igreja. É nesta qualidade que o sacerdote preside à assembléia cristã e celebra o sacrifício eucarístico.
Observe-se que o sacerdote preside às assembléias de culto não por haver sido eleito ou designado pelos fiéis para esta função, pois a Igreja não é o resultado da criatividade dos homens, mas, sim, o fruto de uma convocação (ekklesia, em grego) feita pelo Cristo. É Cristo quem chama, reúne e chefia a sua Igreja; o sacerdote preside às assembléias de culto, fazendo, antes do mais, as vezes de Cristo Chefe ou Cabeça. - É significativo o fato de que as comunidades eclesiais oriundas da Reforma do séc. XVI não tenham experimentado dificuldade em abrir às mulheres o acesso ao pastorado. Isto se explica pelo fato de que tais comunidades vêem na Igreja apenas um agrupamento de fiéis que se estimulam mutuamente na leitura e na vivência da Bíblia; esse agrupamento é relativamente acessório ou secundário; o(a) pastor(a) nessas comunidades é tão somente um(a) cristão(ã) batizado(a); o ministério pastoral é aí uma função exercida em nome dos fiéis; embora o(a) pastor(a) receba uma consagração para o ministério, essa consagração não é reconhecida como sacramento. É precisamente esta temática que o título abaixo desenvolverá.
5. ... No mistério da Igreja
1. O cristão não esquece que a questão da ordenação das mulheres está intimamente associada ao conceito de Igreja. Esta, por sua vez, não pode ser entendida tão somente à luz de critérios de sociologia, psicologia ou história, mas só é adequadamente compreendida à luz da Revelação ou da fé; as ciências humanas não podem compreender plenamente as realidades que a fé professa, pois são sobrenaturais.
Em conseqüência, notemos que, sob a luz da fé, a Igreja é sociedade diferente das outras sociedades quanto à sua natureza e à sua estrutura. Os encargos pastorais, na Igreja não são formas de exercício da autoridade comparáveis às modalidades de autoridade ocorrentes nas sociedades e nos Estados civis. ¹ esse ministério pastoral ou sacerdotal não é o objeto de um direito que todos os cristãos poderiam ter em conseqüência do seu batismo ou em virtude de autopromoção ou ainda como resultado de eleição ou de vontade da coletividade; ainda que alguém seja eleito presbítero ou bispo, como acontecia nos primeiros séculos do Cristianismo, não é a eleição que habilita o candidato ao ministério sacerdotal, mas a imposição das mãos e a oração dos sucessores dos Apóstolos é que habilitam o candidato e dão ao povo de deus a certeza de que o próprio Deus escolheu tal cristão para o ministério. É preciso não esquecer as palavras de Cristo: “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi e institui” (Jo 15,16; cf. Hb 5,4).
Vê-se também que não se deveria propor o acesso das mulheres ao sacerdócio como conseqüência da igualdade dos direitos de todos os homens ou de todos os cristãos. Essa igualdade, proclamada por São Paulo em Gl 3,28, refere-se à vocação universal e indiferenciada que o homem e a mulher recebem à filiação divina e à santidade, e não ao ministério. O ministério vem a ser um tipo de serviço, que não é conferido para a honra ou a vantagem de quem o recebe. O que torna alguém grande no reino dos Céus, não é a especial atividade, sim é, objeto de vocação universal e incondicional para todos os homens. Por conseguinte, se alguém considera o sacerdócio ministerial como um direito, ignora a natureza desse sacerdócio; o batismo não confere nenhum título pessoal ao ministério público na Igreja, mas é o termo de especial desígnio ou chamado que tem sua iniciativa em Deus.
Muito a propósito escreveu D. Bernardin, Presidente da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos, em outubro de 1976:
“Seria errôneo reduzir a questão da ordenação das mulheres, como acontece por vezes, a uma questão de justiça. Tal ponto de vista só se justificaria se fosse um direito concedido por Deus a todas as pessoas e se as virtualidades humanas da pessoa só se pudessem realizar mediante a ordenação. Dado, porém, que o encargo episcopal e o sacerdotal são fundamentalmente ministérios de serviço, a ordenação não completa de modo nenhum a humanidade de quem quer que seja” (“Origins documentary service”, 16/X/1975).
2. Dizem, porém, certos autores haver mulheres que sentem em si a vocação sacerdotal. A propósito observe-se que o atrativo experimentado por tais pessoas é muito nobre, mas ainda não é indício de autêntico chamado divino. O atrativo - que por si é algo de subjetivo - tem de ser autenticado pela Igreja, que Cristo constituiu como prolongação do seu corpo, e na qual Cristo mesmo chama e santifica os homens e as mulheres. Diz o Evangelho que Cristo “escolheu os que Ele queria” (Mc 3,13).
3. É natural que a mulher hoje, tomando consciência das discriminações de que foi vítima outrora, tenha suas reivindicações; entre estas, algumas incluem a aspiração ao ministério sacerdotal. Todavia é necessário lembrar que o sacerdócio ministerial não é propriamente objeto de um direito da pessoa humana nem do cristão, mas se prende ao plano de dispensação da graça, que é gratuito da parte do Senhor Deus. O encargo sacerdotal não se pode tornar o ponto de chegada de uma promoção social; nenhum progresso puramente humano da pessoa ou da sociedade lhe dá, por si mesmo, acesso, pois pertence a outra ordem de valores.
4. Em conclusão, duas observações constituem o fecho da Declaração:
a) a igualdade de vocação dos cristãos não significa identidade de funções. A Igreja é um corpo diferenciado, onde cada membro tem o seu papel próprio. As funções são distintas e não devem ser confundidas, nem hão de se tornar ocasião de soberba ou inveja. O único dom de Deus que deva ser incondicionalmente almejado, é o da caridade (cf. 1Cor 12-13).
b) É para desejar que a mulher e a sociedade em geral tomem mais e mais consciência da incomparável missão da mulher na sociedade de hoje. É à mulher que compete, de modo especial, contribuir para a renovação e a humanização da sociedade hoje como também para a redescoberta, entre os fiéis, da verdadeira face da Igreja. À mulher Deus quis dar os dons da intuição e da delicadeza de sentimentos de que carece o mundo de hoje, cada vez mais marcado pelos critérios da técnica e da produtividade. Esteja a mulher ao lado do homem (e não no lugar do homem), e vice-versa..., e teremos uma sociedade mais feliz, uma Igreja mais rica de valores humanos.
Aqui termina a nossa síntese da Declaração da S. Congregação para a Doutrina da Fé sobre a ordenação de mulheres. Resta acrescentar-lhe nossas observações finais.
6. Observações finais
É nos termos atrás propostos que a Igreja responde hoje a um importante quesito que os movimentos feministas contemporâneos têm lançado. Esta resposta há de ser entendida à luz da fé. Se a Igreja fosse mera instituição humana, a sua posição frente à ordenação de mulheres dificilmente seria compreendida Já, porém, que é uma realidade sacramental, que se rege critérios transcendentais, os fiéis católicos reverenciam a palavra da Igreja e se abstém de comparações fora de propósito, que tenderiam a assimilar a S. Igreja a uma sociedade puramente terrestre. Não tem sentido o confronto entre os dons de Deus e as funções confiadas aos membros da Igreja. A grande preocupação dos cristãos há de ser a de mais cultivar a caridade,... a caridade que é fator de união, antídoto de inveja e vaidade, e que é o autêntico título de nobreza de cada um dos fiéis; com efeito, é a caridade que faz os santos, e os santos é que são os amigos íntimos do Senhor Deus.
A preocupação com o sacerdócio ministerial não deveria fazer que as mulheres esqueçam a tarefa importantíssima que, sem o sacramento da Ordem, lhes compete exercer na Igreja e na sociedade. À mulher, como centro do lar, toca a grande missão de estruturar a sociedade a partir da sua célula mais íntima e vital; é ela quem mais de perto orienta os filhos pequenos, os quais se tornarão um dia os mentores da nação. Na Igreja, à figura feminina toca papel especial; sim, a mulher, na Bíblia, sempre foi tida como sinal ou símbolo religioso por excelência; assim a filha de Sion simboliza o povo de Deus e a mulher no Apocalipse representa a S. Igreja. Que toda mulher se compenetre dessa sua vocação essencial a ser a expressão viva e convincente da criatura que recebe o Senhor Deus e lhe dá vulto em sua corporeidade e em sua vida espiritual!
Vê-se que a Declaração Romana concernente à ordenação de mulheres procura basear-se nas Escrituras e na Tradição, as quais são os canais mais adequados da palavra de Deus. Em última análise, porém, faz-se mister reconhecer que é o magistério vivo da Igreja que, interpretando os dados da fé sob a assistência do Espírito Santo, os formula autenticamente de sorte a dirimir dúvidas e firmar atitudes. Possa o Espírito agir em todos os fiéis cristãos; de tal modo que a questão da ordenação de mulheres não venha a ser mais um tópico que distancie uns dos outros os discípulos de Cristo !
¹ O dom da profecia, no caso, significa as diversas formas de ensinamento que tenham caráter preponderantemente edificante.
¹ Aliás, foi freqüente na história a tentação de comparar a Igreja com as outras sociedades, procurando-se, a partir desse confronto, soluções para os problemas da Igreja; freqüente também foi a tentação de definir a Igreja segundo categorias políticas. Todavia, sempre que prevaleceram tais tendências, registraram-se impasses teológicos.
Fonte: http://www.cleofas.com.br