14.03.2010 - Lamentáveis escândalos sexuais no clero da Alemanha, que foram noticiados pela mídia global recentemente, trouxeram à tona, ao seio da Igreja Católica, uma antiga discussão: seria o celibato a causa da existência desses abusos sexuais?
Para Hans Küng não há dúvidas: “Com a mesma franqueza para abordar, enfim, de peito aberto a questão dos próprios abusos sexuais, seria preciso enfrentar a discussão da sua causa essencial e estrutural: a regra do celibato.” O teólogo suíço afirmou ainda, em artigo para o jornal Le Monde, que a regra do celibato é a “raiz de todos os males”. “[A] obrigação do celibato constitui hoje a causa principal do déficit catastrófico no número de padres, do abandono – carregado de consequências – da prática da comunhão e, em muitos casos, do desmoronamento da assistência espiritual personalizada”, concluiu.
Outro que tem opinião semelhante é o Cardeal Schönborn, arcebispo de Viena: ele disse que, entre as causas dos abusos sexuais, figuram “a educação dos sacerdotes, assim como as consequências da revolução sexual da geração de 1968 e o celibato como desenvolvimento pessoal”. O cardeal pediu uma “mudança de visão” sobre o celibato. Também falou sobre o assunto o jornalista italiano Luigi Accattoli, em artigo publicado em jornal italiano, traduzido e publicado no IHU. Segundo ele, a extinção do celibato clerical está cada vez mais próxima.
Citações a parte, culpar o celibato pela existência de abusos sexuais não é somente uma atitude equivocada, mas uma opinião bastante reducionista. O que verdadeiramente provoca esses escândalos não é o celibato sacerdotal que é, em si, uma dádiva de Deus, um presente maravilhoso. O problema está principalmente na visão que o mundo moderno tem dessa norma da Igreja. É frequente, por exemplo, vermos os meios de comunicação tratando o celibato, a castidade, como se fossem decisões que nos aprisionam, que nos fecham e nos reprimem psicologicamente. Essa ideia equivocada da vida celibatária infelizmente prejudica a conduta sexual de alguns sacerdotes, que, impelidos a pensar que não serão fortes para vencer as tentações que o mundo lhes oferece, acabam perdendo a confiança em Deus e cedendo às paixões desordenadas.
O celibato oprime? Não é isso o que nos ensina a Tradição da Igreja; não é isso o que nos mostra o testemunho da vida dos santos. O celibato, como entrega fiel a Deus, não aprisiona o homem. Muito pelo contrário: enriquecido com a constante graça sobrenatural, com a oração e a mortificação, é um canal que liberta o homem e o faz cada vez mais parecido a Nosso Senhor, Sumo Sacerdote. Diz o Concílio Vaticano II sobre o celibato no sacerdócio:
“Pela virgindade ou pelo celibato observado por amor do reino dos céus, os presbíteros consagram-se por um novo e excelente título a Cristo, aderem a Ele mais fàcilmente com um coração indiviso, n’Ele e por Ele mais livremente se dedicam ao serviço de Deus e dos homens, com mais facilidade servem o seu reino e a obra da regeneração sobrenatural, e tornam-se mais aptos para receberem, de forma mais ampla, a paternidade em Cristo.”
- Presbyterorum Ordinis, n. 16
Então, onde está o problema? Como foi dito anteriormente, o problema está na visão que as pessoas têm do celibato. O Papa destacou, em discurso aos sacerdotes participantes do Congresso Teológico, a importância de “compreender e reafirmar, (…) em nossos dias, o valor do sagrado celibato”. Como a mídia distorce o valor do celibato! Como o mundo desrespeita esse dom sagrado de Deus! É preciso que resgatemos o verdadeiro sentido do celibato e da virgindade consagradas. O papa Pio XII fala delas como um “[d]os mais preciosos tesouros deixados como herança à Igreja pelo seu Fundador” (Sacra Virginitas, n. 1). Ainda nessa encíclica o Venerável Papa faz uma veemente exortação, deixando claro que a castidade não é nociva ao organismo humano:
“Infelizmente, depois do pecado de Adão, as faculdades e as paixões do corpo, estando alteradas, não só procuram dominar os sentidos mas até o espírito, obscurecendo a razão e enfraquecendo a vontade. Mas é-nos dada a graça de Cristo, especialmente nos sacramentos, para nos ajudar a manter o nosso corpo em servidão e a viver do espírito (cf. Gl 5, 25; 1 Cor 9, 27). A virtude da castidade não exige de nós que nos tornemos insensíveis ao estímulo da concupiscência, mas que o subordinemos à razão e à lei da graça, esforçando-nos, segundo as próprias forças, por seguir o que é mais perfeito na vida humana e cristã.”
“Para conseguir, porém, o domínio perfeito do espírito sobre a vida dos sentidos, não basta abstermo-nos apenas dos atos diretamente contrários à castidade, mas é absolutamente necessário renunciar com generosidade a tudo o que ofende de perto ou de longe esta virtude: poderá então o espírito reinar plenamente no corpo e ver a sua vida espiritual em paz e liberdade. Quem não verá, à luz dos princípios católicos, que a castidade perfeita e a virgindade, bem longe de prejudicarem o desenvolvimento normal do homem e da mulher, os elevam pelo contrário à mais alta nobreza moral?”
- Pio XII, Sacra Virginitas, n. 34-35
“A castidade perfeita e a virgindade, bem longe de prejudicarem o desenvolvimento normal do homem e da mulher, os elevam pelo contrário à mais alta nobreza moral”. As palavras do Papa Pio XII são bastante válidas para os nossos dias. Não é preciso extinguir o celibato, mas sim educar os nossos sacerdotes numa visão correta da sexualidade, para que se sintam vivamente amparados pela graça de Deus, em constante oração e devoção a Nossa Senhora. “Ah, como fogem os demônios à presença de Nossa Senhora!”, exclama Santo Afonso de Ligório. Tenham os sacerdotes constante confiança em Maria. Que eles recorram constantemente à sua poderosa intercessão, que os livra e afugenta de todos os males.
Graça e paz.
Salve Maria Santíssima!
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Leia também: Celibato e pedofilia, do blog O Possível e O Extraordinário.
Fonte: http://beinbetter.wordpress.com/