03.01.2010 -
Homilia do Papa João Paulo II na Missa
da Solenidade de Maria Santíssima, Mãe de Deus
1 de Janeiro de 1997
Fonte: Santa Sé
1. «Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus» (Lc 1, 31). Jesus quer dizer «Deus que salva».
Jesus, nome dado pelo próprio Deus, significa que «em nenhum outro há salvação» (At 4, 12) senão em Jesus de Nazaré, nascido de Maria Virgem. N’Ele Deus Se fez homem, vindo assim ao encontro de cada ser humano.
«Tendo Deus falado outrora aos nossos pais, muitas vezes… pelos Profetas, agora falou-nos nestes últimos tempos pelo Filho» (Hb 1, 1). Este Filho é o Verbo eterno, consubstancial ao Pai, que Se fez homem para nos revelar o Pai e para nos tornar possível a compreensão de toda a verdade acerca de nós. Falou-nos com palavras humanas, e também com as suas obras e com a sua própria vida: desde o nascimento até à morte na cruz e à ressurreição.
Tudo isto, desde o início, causa maravilha. Já os pastores, vindos a Belém, se admiraram de quanto tinham visto, e os outros ficaram atônitos escutando o que eles contavam a respeito do Recém-nascido (cf. Lc 2, 18). Guiados pela intuição da fé, eles reconheceram o Messias no menino que jazia na manjedoura, e o pobre nascimento em Belém do Filho de Deus impeliu-os a proclamar com alegria a glória do Altíssimo.
2. O nome Jesus pertencia desde o início Àquele que foi chamado assim no oitavo dia depois do nascimento. Num certo sentido, ao vir ao mundo Ele trouxe consigo este nome, que exprime de maneira admirável a essência e a missão do Verbo encarnado.
Ele veio ao mundo para salvar a humanidade. Quando, pois, Lhe foi imposto este nome, foi revelado ao mesmo tempo quem era e qual haveria de ser a sua missão. Muitos em Israel tinham este nome, mas Ele teve-o dum modo único, realizando em plenitude o seu significado: Jesus de Nazaré, Salvador do mundo.
3. São Paulo, como acabamos de escutar na segunda Leitura, escreve: «… ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o Seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para que recebêssemos a adoção de filhos» (Gl 4, 4-5). O tempo está unido ao nome de Jesus desde o início. Este nome acompanha-O na sua vicissitude terrena imersa no tempo, mas sem que Ele esteja submetido a ela, pois n’Ele está a plenitude do tempo. Antes, ao tempo humano Deus trouxe a plenitude, entrando com ela na história do homem. Não entrou como um conceito abstrato. Entrou como Pai que dá a vida, — uma vida nova, a vida divina — aos seus filhos adotivos. Por obra de Jesus Cristo todos nós podemos participar da vida divina: filhos no Filho, destinados à glória da eternidade. São Paulo aprofunda depois esta verdade: «E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações, o Espírito que clama: “Abbá, Pai!”» (Gl 4, 6). Em nós, homens, a filiação divina provém de Cristo e atua-se por obra do Espírito Santo. O Espírito vem para nos ensinar que somos filhos e, ao mesmo tempo, para tornar efetiva em nós esta filiação divina. O Filho é Aquele que com todo o seu ser diz a Deus: «Abbá, Pai».
Estamos a tocar aqui o ápice do mistério da nossa vida cristã. O nome «cristão » indica, de fato, um novo modo de ser: existir à semelhança do Filho de Deus. Como filhos no Filho, participamos na salvação, a qual não é apenas libertação do mal, mas é, antes de tudo, plenitude do bem: do sumo bem da filiação de Deus. E é o Espírito de Deus que renova a face da terra (cf. Sl 103[104], 30). No primeiro dia do ano novo a Igreja convida-nos a tomar consciência cada vez mais profunda disto. Convida-nos a considerar nessa luz o tempo humano.
4. A liturgia hodierna celebra a solenidade da Mãe de Deus. Maria é Aquela que foi escolhida para ser Mãe do Redentor, compartilhando intimamente a Sua missão. Na luz do Natal, ilumina-se o mistério da sua maternidade divina. Maria, Mãe de Jesus que nasce na Gruta de Belém, é também Mãe de cada homem que vem ao mundo. Como não confiar a Ela o ano que inicia, para implorar que seja um tempo de serenidade e de paz para a humanidade inteira? No dia em que se abre este novo ano sob o olhar da Mãe de Deus que abençoa, invoquemos para cada um e para todos o dom da paz.
5. Com efeito, já há diversos anos, o dia primeiro de Janeiro é celebrado, por iniciativa do meu venerado predecessor, o Papa Paulo VI, como Dia Mundial da Paz. Estamos aqui, na Basílica Vaticana, também este ano, para implorar o dom da paz para as Nações do mundo inteiro.
(…)
Como é necessário o perdão para fazer desabrochar a paz no coração de cada crente e de cada pessoa de boa vontade! Paz e perdão constituem como que um binômio inseparável. Cada pessoa de boa vontade, desejosa de trabalhar incansavelmente para a edificação da civilização do amor, deve fazer próprio este convite: Oferece o perdão, recebe a paz.
6. A Igreja ora e trabalha pela paz em todas as dimensões: pela paz das consciências, pela paz das famílias, pela paz entre as Nações. Ela é solícita pela paz no mundo, porque é consciente de que somente na paz se pode desenvolver, de modo autêntico, a grande comunidade dos homens.
Encaminhando-nos para o termo deste século, em que o mundo e, especialmente, a Europa experimentaram não poucas guerras e sofrimentos, como desejaríamos que o limiar do ano 2000 pudesse ser cruzado por todos os homens sob o sinal da paz! Por isto, pensando na humanidade chamada a viver outro ano de graça, repitamos com Moisés as palavras da Antiga Aliança: «Que o Senhor te abençoe e te proteja. Que o Senhor faça resplandecer a Sua face sobre ti e te seja benevolente. Que o Senhor dirija o Seu olhar sobre ti e te conceda a paz!» (Nm 6, 24-26). Além disso, repitamos com fé e esperança as palavras do Apóstolo: Cristo é a nossa paz! (cf. Hb 2, 14). Tenhamos confiança na ajuda do Senhor e na materna proteção de Maria, Rainha da paz. Apoiemos esta nossa esperança em Jesus, nome de salvação dado aos homens de todas as línguas e raças. Confessando o Seu nome, caminhemos confiantes rumo ao futuro. Certos de que não ficaremos desiludidos, se confiarmos no santíssimo Nome de Jesus.
In te Domine speravi,
non confundar in aeternum.
Amém!
Papa João Paulo II
Homilia na Solenidade de Maria Santíssima, Mãe de Deus
1º de janeiro de 1997