Conferência de Dom Athanasius Schneider sobre a liturgia nos Padres


17.10.2009 - O livro do Apocalipse descreve a liturgia celeste como modelo da terrestre: este é o modelo litúrgico desde os tempos apostólicos até o Concílio Vaticano II. Confirmam-no os escritos de Clemente I (primeiro século), a Passio Perpetuae Felicitatis, a Anáfora de Jerusalém, as Catequeses Mistagógicas (séculos III e IV), São João Crisóstomo. Convém, pois, voltar à pristina sanctorum patruum norma. O Papa São Clemente recorda como se deve, no rito, conformar aos anjos que realizam o culto celeste e ao hino angélico do Apocalipse, o Trisaghion, Santo Santo Santo.

Cobrir a face, inclinar-se, dar a Deus Uno e Trino o primeiro e único lugar: eis os gestos dos Anjos do apocalipse no culto ao Onipotente.

O culto deve ser um Ordo (em grego tàxis), uma ordem, diz Clemente no primeiro século. Isto é, ele deve ser determinado com precisão e não ser deixado à improvisação.

O segundo testemunho (o relato do martírio de Perpétua e Felicidade) do século II, de ambiente africano, diz que os mártires que entram no Paraíso ouvem os Anjos cantando o Trisaghion.

A Anáfora de São Tiago representa a tradição litúrgica de Jerusalém, do século IV. Também aqui se toma a liturgia terrena como espelho da liturgia angélica. Recordam-se ainda os serafins, que circundavam o trono do Altíssimo e com as suas seis asas, com duas cobriam a face, com duas os pés e com duas voavam, segundo Isaías. A Anáfora nos diz que os serafins cantam incessantemente a teologia, ou seja, no sentido daquele texto, cantam o louvor e a adoração a Deus. A doxologia deve ser teologia: ou seja, o culto externo deve desenvolver-se de modo a exprimir a Fé em Deus Uno e Trino. Render glória (doxa) significa exprimir a fé. A liturgia deve ser absolutamente teocêntrica; um antropocentrismo na liturgia é completamente estranho às ideias dos Padres.

Destas reminiscências seráficas, no antigo rito romano, derivam o cobrirem-se as mãos na bênção eucarística, ou as quirotecas dos bispos, ou o gesto do subdiácono que cobre as mãos, ou os véus dos objetos litúrgicos. Na liturgia oriental tal função é realizada pela iconostase.

O fato de colocar hoje a cadeira do sacerdote no centro é algo de mais oposto e contrário ao pensamento dos Santos Padres e ao sentido mistagógico que nos vem da divina revelação, em primeiro lugar do Apocalipse. Também o fato de tocar as espécies por parte dos leigos, e frequentemente sem véus nem gestos de adoração, está em contraste com este sentido da liturgia.

São João Crisóstomo na sua homilia sobre Isaías destaca que aos sacerdotes seja concedido poder tocar com as suas mãos consagradas aquilo que os serafins não podem tocar. De fato, em Isaías o serafim pegou com uma pinça a brasa, a qual Isaías depois passou sobre os lábios para purificar-se, tocando aquilo que o serafim somente com a pinça tinha ousado pegar. E quão mais precioso, elevado e abrasador é o Corpo do Senhor, o Sancta Sanctorum.

Por isto, adoração, reverência, gestos de latria na liturgia não podem ser omitidos, porque os exemplos nos vêm dos anjos. A proskynesis, a prostração adorante, está associada nos escritos dos Padres ao cobrimento e ao culto.

As reformas litúrgicas, tanto depois do Concílio de Trento quanto na Sacrosanctum Concilium, se reportam à “antiga norma dos Santos Padres”. Convém, portanto, exprimir mais claramente o sagrado (SC 21). Um retorno aos Padres não pode, pois, levar a uma redução dos gestos de reverência e de adoração, mas ao seu aumento, de maneira a exprimir de forma ainda mais evidente e compreensível o terribile mysterium.

Fonte: Messa in latino

Tradução: OBLATVS


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