11.07.2009 - Reportagem da revista ISTOÉ, julho 2009
Sete décadas depois da morte de Lampião, moradores de pequenas cidades nordestinas experimentam o terror típico dos tempos do cangaço. Como naquela época, bandos armados invadem os lugarejos, saqueiam e desaparecem tão rápido quanto surgiram. A diferença é que agora os bandidos usam modernas armas de guerra e não saem a galope em cavalos. O alvo do roubo também mudou: agora são milhões de reais guardados nos cofres das agências bancárias.
As quadrilhas são ligadas às grandes facções brasileiras do crime organizado e debandaram para os municípios - a maioria com menos de 20 mil habitantes e nenhum deles com mais de 80 mil - onde a segurança é menor e o lucro é grande. Com isso, muitas cidades do interior deixaram de ser recantos de paz e sossego e a população está assustada com a escalada da violência. Todas as regiões sofrem com isso, mas o quadro é mais assustador no Nordeste. Até o início do mês, foram registrados no Maranhão 18 assaltos a banco no interior, contra 16 em todo o ano passado. No Ceará, o Sindicato dos Bancários pede mais proteção para as agências. No Piauí, a sucessão de assaltos leva grandes bancos a cogitar uma saída drástica: o fechamento de agências. "A interiorização do crime é visível a olho nu", diz o juiz Edson Vidigal, exministro do STJ. "O interior sofre com a ausência dos agentes da lei."
Não faltam exemplos para comprovar essa falta de policiamento. Numa ação ousada realizada no dia 30 de junho, um bando formado por 12 bandidos armados com metralhadoras e fuzis roubou a agência do Banco do Brasil em Santa Luzia do Tide, no Maranhão, levando R$ 1 milhão. Depois do crime, 40 policiais e um helicóptero passaram a caçar os bandidos, mas no momento do assalto, em que os ladrões fizeram vários disparos, nenhum policial apareceu. "Os funcionários dos bancos dessas regiões têm convivido com a insegurança", diz Rosário Braga, secretária-geral do Sindicato dos Bancários do Maranhão.
O dinheiro conseguido nessas ações financia as quadrilhas dos grandes centros urbanos. A situação é tão grave que, depois de sofrer sete assaltos, a direção do Banco do Brasil no Piauí transformou em posto pagador a agência localizada na cidade de São Miguel do Tapuio. Agora, o BB ameaça fechar o posto, caso a segurança não seja garantida. "Os bandidos estão audaciosos e o governo precisa agir", reclama o deputado estadual Paulo Martins (PT). Numa ação realizada em maio, na cidade baiana de Mutuípe, com 21 mil habitantes, 12 assaltantes armados de fuzis invadiram uma agência e fizeram três policiais militares reféns.
Em Mato Grosso, dos 13 assaltos a banco ocorridos em 2008, nove ocorreram no interior - num deles, os bandidos mantiveram 50 clientes reféns. A interiorização do crime é nítida no Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros, organizado pelo pesquisador da Unesco, Julio Jacobo Waiselfisz, que mostra o aumento do número de homicídios nas regiões interioranas. "A canalização de recursos para capitais e regiões metropolitanas em 1999 e o surgimento de novos polos de crescimento no interior atraíram a criminalidade", explica.
No Sudeste, o problema maior é em São Paulo. No interior paulista, as ocorrências de roubo de gado têm crescido assustadoramente. Na região entre Bauru e Lins, os assaltos já passam de 30. Num deles, uma família de cinco pessoas ficou refém por 12 horas. "As pessoas ficam com medo de registrar", diz o presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Lins, Nelson Castanho.
"A polícia está sem recursos e a Justiça não consegue manter os bandidos presos. Assim, diminuem até as denúncias", diz Castanho, que ressalta haver todo tipo de roubo e crime nas fazendas. "Desde ração a cabeças de gado, passando por invasões, assaltos aos moradores e agressões, há todo tipo de crime", diz ele. Alguns fazendeiros investem em segurança privada, já que a recém-criada Polícia Militar Rural ainda não apresentou os resultados esperados.
AGROBANDIDOS Em São Paulo e no Rio Grande do Sul, o alvo são os rebanhos. Cada cabeça de gado chega a valer R$ 2,5 mil
Em Bauru, de janeiro até agora, mais de 500 cabeças de gado foram parar nas mãos de bandidos. Em Lins, uma quadrilha levou 90 cabeças de gado em uma só investida. Cada boi pode ser negociado depois por até R$ 2,5 mil. "Se as autoridades não tomarem providências, isso aqui vai virar um faroeste", diz Castanho.
No Rio Grande do Sul, a Federação da Agricultura desenvolveu o Ranking dos Roubos de Gado, tabulando município a município os crimes praticados. Em primeiro lugar está Bagé, com 259 cabeças de gado surrupiadas. O presidente da Associação Rural de Bagé, Eduardo Moglia Suñe, lamenta: "Alguns fazendeiros continuam trabalhando por teimosia. O prejuízo é muito grande." (fim)
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