10.04.2009 - Por Christopher West
Vou refletir aqui sobre o mistério do Corpo de Cristo “entregue por nós” na cruz. Gostaria de falar a partir de um ponto de vista familiar aos místicos de nossa tradição, mas infelizmente não familiar à maioria dos católicos nos bancos das igrejas. É uma idéia que, se a meditarmos em oração, pode nos ajudar a resgatar a santidade do corpo e da união marital. É a idéia da cruz como o “leito nupcial” de Cristo – o lugar onde ele consuma seu amor pela Sua Esposa, a Igreja.
Essa imagem pode fazer levantar algumas sobrancelhas, mas ela não precisa ser causa de escândalo, basta compreendermos corretamente o simbolismo esponsal da Bíblia. Como observa o Catecismo, “Toda a vida cristã traz a marca do amor esponsal de Cristo e da Igreja. Já o Batismo... é um mistério nupcial; é, por assim dizer, o banho das núpcias que precede o banquete de núpcias, a Eucaristia” (Catec. Ig. Cat. 1617). Podemos também relembrar as últimas palavras de amor de Cristo, proferidas da cruz para a Sua Esposa: “Está consumado” (ver João 19, 30).
Santo Agostinho escreveu: “Como um noivo, Cristo saiu de seus aposentos... Ele veio para o leito nupcial da cruz, e sendo levantado nela, consumou seu matrimônio. E quando Ele percebeu os suspiros de sua criatura, amorosamente Ele se entregou aos tormentos no lugar de sua Esposa e uniu-se a ela para sempre” (Sobre o Casamento). Santa Matilde, uma mística alemã do século XIII, espelhou a mesma idéia quando escreveu que “o nobre leito nupcial [de Cristo] foi a mesma dura madeira da Cruz, a qual Ele aceitou com maior júbilo e ardor do que um noivo cheio de satisfação".
A primeira vez que ouvi essa idéia da cruz como “leito nupcial” foi através do Bispo Fulton Sheen, em uma palestra gravada que ouvi alguns anos atrás. A voz forte de Sheen ainda ecoa em minha mente: “Vocês sabem o que está acontecendo aos pés da cruz?”, ele perguntou. “Núpcias, é o que está havendo! Núpcias!”. Assim como Agostinho, ele então descreveu a cruz como o “leito nupcial” que Ele aceitou não no prazer, mas na dor, a fim de unir-se para sempre com sua Esposa. O bom bispo continuou explicando que sempre que Jesus chama Maria de “mulher” (tal como ocorreu nas Bodas de Caná e na cruz), Ele está falando como o novo Adão para a nova Eva, o Esposo para a Esposa. Aqui, é claro, as relações estão fora da esfera do sangue. O fato de que a mãe de Cristo é a “mulher”, simbolizando sua Esposa, não precisa nos preocupar. O matrimônio do novo Adão e da nova Eva, consumado na cruz, é místico e virginal. O próprio Catecismo refere-se à essa “mulher” (Maria) como a “Esposa do Cordeiro” (Catec. Ig. Cat. 1138). Contemplar esse simbolismo esponsal nos abre verdadeiros tesouros. Assim como o primeiro Adão foi colocado em um sono profundo e Eva veio de seu lado, assim o novo Adão aceitou o sono da morte e a nova Eva nasceu de seu lado (ver Catec. Ig. Cat. 766). Normalmente isso é figurado artisticamente como uma imagem da “mulher” (Maria) segurando um cálice – ou algumas vezes um largo jarro, reminiscência de Caná – aos pés da cruz, recebendo o fluxo de sangue e água que saíam do lado de Cristo. O sangue e a água, é claro, simbolizam o “banho de núpcias” do Batismo e a “festa nupcial” da Eucaristia.
E ainda há mais coisas aqui! A união mística do novo Adão e da nova Eva já rende frutos sobrenaturais. “Mulher, eis aí teu filho!”. Então, Ele disse para seu discípulo, “Eis aí tua mãe!” (João 19, 26-27). Pode-se escrever essas palavras de Cristo de outro modo: “Mulher, eis que dás à luz um novo filho”. O sofrimento de Maria aos pés da cruz são suas dores de parto ao dar à luz todos os filhos da Igreja. Aqui o discípulo amado (João) representa toda a descendência “nascida de novo, não de uma semente corruptível, mas incorruptível” (1 Pedro 1, 23), “não do sangue,... mas de Deus” (João 1, 13).
São Paulo não estava brincando quando descreveu a união dos esposos como um “grande mistério”, que se refere a Cristo e a Igreja (ver Efésios 5, 31-32). Jesus, abri nossos corações novamente para esse “grande mistério”, revelado através do vosso corpo entregue por nós no “leito nupcial” da cruz. Amem.
Fonte: http://vidaecastidade.blogspot.com/