Parte II
DEUS PAI
Muito já Me devia a humanidade. Dera-lhe o ser, ao criar o homem a Minha imagem e semelhança. Então ele possuía a obrigação de dar-Me glória. Recusou-se a fazê-lo, glorificou-se a si mesmo, não aceitou a obediência por Mim imposta, tornou-se Meu inimigo.
Então, com humilhação destruí sua soberba. Humilhei-Me (em Cristo), assumi vossa natureza, libertei-vos da escravidão do demônio, tornei-vos livre. O tesouro do Sangue, pelo qual a humanidade foi recriada, ficou sendo uma dívida. Entendes pois, como depois da Redenção, o homem tem maior obrigação para Comigo. Devem-Me glória e louvor. Uma dívida de amor para Comigo e o próximo, que é paga quando as pessoas seguem as pegadas do Meu Filho Unigênito, Palavra Encarnada, mediante as práticas das virtudes interiores...
... Ninguém escapará de Minhas Mãos. "Sou aquele que Sou" (Ex 3.14) e vós, vós não possuís a razão do próprio ser. Sois aquele que Eu fiz. Criei tudo o que participa do ser; somente o pecado não procede de Mim, porque é negação.
Por não estar em Mim, o pecado não merece amor. Quem o faz, ofende toda criação e odeia-Me . O homem tem obrigações de Me querer bem. Sou imensamente bom, dei-lhe o ser, numa chama de caridade. Todavia, os maus fogem de Mim. Mas, por justiça ou misericórdia, ninguém escapa das Minhas Mãos.
... Eis Meu plano: criara o homem à Minha imagem e semelhança para que alcançasse a vida eterna, participasse do Meu Ser, experimentasse Minha suma, eterna e doce bondade.
O pecado veio impedir-lhe de atingir essa meta. O homem deixava de realizar o Meu plano, pois a culpa lhe fechara o Céu e a porta da Minha misericórdia.
O pecado fez germinar na humanidade espinhos e sofrimentos, tribulações* numerosas, rebelião interna.
Ao revoltar-se contra Mim o homem criava a rebelião dentro de si. Em conseqüência da perda do estado de inocência, a carne se revoltou contra o espírito... Imediatamente brotou um rio tempestuoso, cujas ondas continuam a açoitar a humanidade. São as misérias e males provenientes do próprio homem, do demônio e do mundo. Nele todos se afogavam; ninguém mais, graças a virtudes pessoais, atingia a vida eterna.
Para remediar tantos males, construí a Ponte no Meu Filho, que permitiria a travessia do rio sem perigo de afogar-se. O rio é o proceloso* mar desta tenebrosa* vida...
... Quero que contemples a Ponte de Meu Filho, que vejas sua grandiosidade. Ela se estende do céu à terra, pois nela a "terra" da vossa natureza humana está unida à divindade sublime, graças à encarnação que realizei no homem. Todos vós deveis passar por esta Ponte, louvando-Me através do trabalho pela salvação dos homens e tolerando muitas dificuldades, a exemplo do Meu doce e amoroso Verbo Encarnado. Não há outro modo de chegar até Mim.
... Cada pessoa tem uma vinha, a vinha d a própria alma. Nela trabalha com a vontade pessoal, livre, durante o tempo desta vida. Acabado este tempo nenhum outro trabalho será realizado, seja para o bem, seja para o mal.
... Começareis por purificar-vos com a contrição interior, desapegando- vos da e desejando a virtude. Sem esta predisposição, exigida na medida de vossas possibilidades como ramos unidos à Videira, que é Meu Filho (Jo 15,1). nada recebereis.
Dizia Meu Filho: "Éu sou a videira verdadeira e vós os ramos; Meu Pai é o agricultor" (Jo 15,5). Sim, Eu Sou o agricultor, de Mim se originam todos os seres. Tenho um poder incalculável, pelo qual governo o universo; nada Me escapa. Fui Eu o agricultor que plantou a verdadeira vinha, Cristo, no chão da humanidade, para que vós, unidos a Ele, possais frutificar. Quem não produzir ações santas e boas, será cortado da videira; e secará. Separado, perderá a vida da graça e irá para o fogo eterno...
Sabes que os mandamentos da Lei se reduzem a dois sem eles, nenhum outro é observado. São: amar-Me sobre todas as coisas e amar o próximo como a ti mesma. Eis o começo, o meio e o fim dos mandamentos da lei.
Tribulações *- aflições, tormentos.
Tenebrosa * - envolvida de trevas.
Proceloso* - tempestuoso.
Iniquidade* - injustiça.
Todavia esses "dois" não se "reúnem" em Mim sem os "três", isto é, sem a unificação das três faculdades da alma: A memória a inteligência e a vontade. A memória há de recordar-se dos Meus beneficies e da Minha bondade; a inteligência pensará no amor inefável* revelado em Cristo, pois Ele se oferece como objeto de reflexão, para manifestar a chama do Meu amor; a vontade unindo-se às faculdades anteriores, Me amará e desejará como seu fim.
O coração humano, ao ser atraído pelo amor, leva consigo todas as faculdades da alma: Quando são harmonizadas e reunidas tais faculdades, todas as ações humanas - corporais ou espirituais - ficam-Me agradáveis, pois unem-se a Mim na caridade.
Foi exatamente para isso que Meu Filho se elevou na cruz, trilhando o caminho do amor cruciante. Ao dizer, "Quando Eu for elevado, atrairei a Mim todas as coisas", ele queria significar: quando o coração humano e as faculdades forem atraídas, todas as demais faculdades e suas ações o serão...
É muita estreita a união dessas três faculdades. Quando uma delas Me ofende, as outras também o fazem. Como disse, uma apresenta à outra o bem ou o mal, conforme agrada ao livre arbítrio.
O livre arbítrio, se acha na vontade e a move como quer, em conformidade ou não com a razão.
Possuis a razão *, sempre unida a Mim, a menos que o livre arbítrio a afaste mediante o amor desordenado, e tende em vós uma lei perversa, que luta contra o espírito. Ensinou o apostolo Paulo em sua carta, C1 3,5, a mortificar o corpo e a destruir a vontade própria, ou seja, refrear o corpo mortificando a carne, quando ela se opõe ao espírito. Tendes, então, duas partes em vós mesmos: a sensualidade e a razão. A sensualidade* foi dada como servidora, a fím de que as virtudes serram exercias e provadas através do corpo. O homem é livre, já que Meu Filho o libertou com Seu Sangue. Ninguém pode dominar a pessoa humana quanto a vontade, pois ela possui o livre arbítrio. Este se identifica com a vontade, concorda com ela. Fica, pois, o livre arbítrio entre a sensualidade, e a razão, e inclina-se ora de um lado ora de outro, conforme preferir...
Quando a pessoa tenta livremente reunir* as três faculdades, memória, inteligência e vontade, em Mim, na maneira explicada, todas as atividades espirituais e corporais humanas ficam unificadas. O livre arbítrio se afasta da sensualidade, tende para o lado da razão.
Razão* - iluminação direta de Deus ao homem que o faz distinguir o bem do mal ( consciência ).
Inefável* - encantador.
Ninguém pode vir a Mim, senão Por meio de Cristo. Esta a razão pela qual fiz d'Ele uma Ponte de três degraus. Esses três degraus representam os três estados espirituais do homem. O pavimento desta ponte é feito de pedras, a fim de que a chuva (da justiça divina) não retenha o caminhante. "Pedras" são as virtudes verdadeiras e reais. Antes da Paixão do Meu Filho, elas ainda não tinham sido assentadas, motivo pelo qual os antigos não atingiam o céu, mesmo que vivessem piedosamente. O Paraíso ainda não fora aberto com a chave do Sangue, e a chuva da justiça divina impedia a caminhada.
Quando aquelas pedras foram assentadas no Corpo do Meu Filho - por Mim comparado a uma ponte - foram embebidas, amalgamadas *, e assentadas com sangue. Em outras palavras: o sangue (humano) foi misturado com a cal da divindade e fortemente queimado no calor da caridade.
Tais pedras foram postas em Cristo por Mim, mas é n'Ele que toda virtude é comprovada e vivificada. Fora de Jesus ninguém possui a vida da graça. Ocorre estar n'Ele, trilhar suas estradas, viver Sua mensagem. Somente Ele faz crescer as virtudes, somente Ele as constrói como pedras vivas, cimentando-as com o próprio Sangue.
Nele, todos os fiéis caminham na liberdade, sem o medo da justiça divina, pois vão cobertos pela misericórdia, descida do céu no dia da encarnação.
Foi a chave do Sangue de Cristo que abriu o céu. Portanto, esta ponte é ladrilhada; e seu telhado é a misericórdia.
Possui também uma despensa, constituída pela hierarquia da Santa Igreja, que conserva e distribui o Pão da Vida e o Sangue. Assim, Minhas criaturas, viandantes* e peregrinas, não fraguejam de cansaço na viagem. Para isto ordenei que vos fosse dado o Corpo e o Sangue do Meu Filho, Homem Deus...
...Disse Jesus: "Eu sou o caminho, a verdade, e a vida; quem vai por Mim não caminha nas trevas, mas na luz" (Jo, 8,12)... Quem vai por tal caminho é filho da verdade, atravessa a ponte e chega até Mim, verdade eterna, oceano de paz. Quem não trilha esse caminho, vai pela estrada inferior, no rio do pecado. É uma estrada sem pedras, feita somente de água, inconsistente; por sobre ela ninguém vai sem afundar. É o caminho dos prazeres e das altas posições, daqueles cujo amor não repousa em Mim e nas virtudes, mas no apego desordenado ao que é humano e passageiro. Tais pessoas são como a água sempre a escorrer. À semelhança daquelas realidades, vão passando.
Amalgamadas* - ligadas.
Viandantes* - viajantes.
Eles acham que são as coisas criadas, objeto de seu amor, que se vão; na realidade, também eles caminham continuamente em direção à morte. Bem que gostariam de deter-se, reter na vida as coisas que amam. Seriam felizes se as coisas não passassem. Perdem-nas todavia, seja por causa da morte, seja pelos acontecimentos com que faço, escapar-lhes das mão, os bens deste mundo...
... Com o retorno de Meu Filho ao céu, enviei o Mestre, o Espírito Santo. Ele veio no Meu poder, na sabedoria do Filho, e na própria clemência. É uma só coisa Comigo e o Filho. Por sua vinda fortaleceu o Caminho - Mensagem deixado no mundo por Jesus. O Espírito Santo é qual mãe a nutrir no Divino Amor. Ele liberta o homem, torna-o dono de si, isento da escravidão e do egoísmo. A chama da Minha caridade (o Espírito Santo) não sobrevive junto ao egoísmo....
... Assim, todos os homens, recebem luzes para conhecer a verdade. Basta que cada um o queira, que não destrua a luz da razão, pelo egoísmo desordenado.
A mensagem de Jesus é verdadeira e ficou no mundo qual pequena barca para retirar os pecadores do rio do pecado e conduzi-[os ao porto da salvação.
Primeiro, coloquei Meu Filho como Ponte - Pessoa, a conviver com os homens; após Sua morte, ficou a Ponte - Mensagem possuindo ela Meu poder, a sabedoria do Filho e o amor do Espírito. O poder fortifica os caminhantes, a sabedoria ilumina e ajuda a reconhecer a Verdade, o Espírito Santo infunde o amor que aperfeiçoa, que destrói o egoísmo e conserva no homem o apego ao bem...
O Verbo encarnado, Meu Filho único e ponte de glória, deu aos homens vida e grandeza. Eram escravos do demônio e Ele os libertou.
Para que cumprisse tal missão, tornei-O servo; para cobrir a desobediência de Adão exigi que obedecesse; para confundir o orgulho, humilhou-se até a morte na cruz. Por Sua morte, destruiu o pecado. No intuito de livrar a humanidade da morte eterna, fez do Seu Corpo uma bigorna *.
No entanto os pecadores desprezam Seu Sangue, pisoteiam-No com um amor desordenado. Esta é a injustiça, este o julgamento falso a respeito do qual o mundo é e será repreendido até o dia do juízo final. Tal repreensão começou quando enviei o Espírito Santo sobre os apóstolos. São três as repreensões: a voz da Igreja, o Juízo Particular e o Juízo Final...
Bigorna* - peça onde se moldam por "malhação", os metais.
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