03.01.2009 - Uma equipe de perfuração recentemente atravessou camadas de rochas profundas por sob o Havaí e acidentalmente se tornou o primeiro grupo de seres humanos conhecido a ter perfurado a crosta terrestre em profundidade suficiente para chegar ao magma - a forma derretida de rocha que ocasionalmente atinge a superfície na forma de erupções de lava - em seu ambiente natural, anunciaram cientistas norte-americanos em dezembro.
"Trata-se de uma descoberta sem precedentes", disse Bruce Marsh, especialista em vulcões da Universidade Johns Hopkins, em Maryland, que participará do estudo das amostras obtidas pelos perfuradores.
Normalmente, ele disse, os pesquisadores de vulcões precisam realizar "estudos post-mortem" de magma há muito solidificado, ou estudar a lava ainda em estado ativo em períodos de erupções vulcânicas. Mas desta vez eles conseguiram encontrar o magma em seu ambiente natural - algo que Marsh descreveu como tão emocionante, para os membros de sua profissão, quanto encontrar um dinossauro vivo brincando em uma ilha distante seria para um paleontologista.
"Esse é o meu Jurassic Park", ele declarou em uma reunião da União Geofísica Americana em San Francisco.
Primeiro contato
A descoberta foi feita a uma profundidade de 2,5 quilômetros, durante uma escavação exploratória cujo objetivo era tentar localizar fontes de energia geotérmica. A equipe de escavação encontrou algo de incomum durante operações de rotina conduzidas no Projeto Geotérmico de Puna, uma propriedade controlada pela Ormat Technologies, de Reno, Nevada. Quando os trabalhadores tentaram retomar suas escavações, descobriram que o magma havia subido por cerca de oito metros do encanamento que inseriram no poço exploratório. A rocha se solidificou na forma de uma substância clara e vítrea, aparentemente devido ao resfriamento rápido pelo qual passou depois de encontrar a água do lençol freático.
Os cientistas sabiam há muito que era provável a presença de câmaras de magma na vizinhança do local da escavação. A perfuração estava sendo conduzida em um esforço para tentar encontrar fontes de abastecimento para uma usina de energia geotérmica já existente, construída para colher calor da região vulcânica mais ativa do mundo, em torno do vulcão Kilauea, que vem emitindo lava continuamente desde 1983. Don Thomas, geoquímico do Centro de Estudo de Vulcões Ativos da Universidade do Havaí, disse que era apenas questão de tempo antes que alguma operação de perfuração viesse a atingir magma quente.
Mas que isso tenha de fato acontecido na prática "é tremendamente emocionante", disse Thomas, que não fazia parte da equipe que realizou a descoberta.
Os pesquisadores descobriram, adicionalmente, que o magma é feito de dacito, uma espécie de rocha precursora do granito, e não do basalto que forma a maior parte do Havaí.
"Se tivéssemos encontrado basalto, a surpresa não teria sido grande", disse William Teplow, geólogo consultor da U. S. Geothermal, que está assessorando o projeto.
Os cientistas acreditavam há muito que o dacito pudesse se separar do magma basáltico para formar rochas graníticas. Mas eles jamais esperavam ver o processo em plena operação.
"Essa pode ser a primeira vez que a geração do granito foi observada de forma concreta em seu estado formativo, na natureza", disse Teplow. "É uma observação importante porque é esse processo que diferencia a crosta continental granítica da crosta oceânica, mais primitiva e basáltica".
Marsh está entusiasmado com as perspectivas de novos estudos. "Isso é apenas a ponta do iceberg", ele declarou. "Não sabemos onde vai nos levar, mas se trata de uma oportunidade de ouro".
Pode até ser possível conduzir experiências científicas no interior do magma.
"Poderíamos estar falando do primeiro observatório de magma instalado no planeta", disse Marsh. "Trata-se de um evento singular, do nosso primeiro contato com as entranhas da Terra, onde vive o magma".
Poderio econômico
Com uma temperatura estimada em cerca de 1.050 graus centígrados, a camada de magma também poderia ser valiosa como uma fonte de calor de alta qualidade para a produção de energia geotérmica.
"Mas a primeira coisa com que devemos nos preocupar é compreender os aspectos científicos", disse Lucien Bronicki, presidente do conselho e vice-presidente de tecnologia da Ormat.
Marsh, da Universidade Johns Hopkins, acrescentou que o corpo de magma localizado é grande o suficiente para que seu uso como fonte geradora de energia não interfira com futuras pesquisas científicas na mesma região.
"O poço que escavamos tem as dimensões que uma picada de mosquito teria nas costas de um elefante", ele afirmou.
Tradução: Paulo Migliacci
National Geographic