24.10.2008 - Para autoridades da Organização Mundial de Saúde (OMS), a crise financeira global trouxe uma nova preocupação: o aumento da ocorrência de suicídios, como se junto da desvalorização da bolsa, se intensificasse a depreciação do valor da vida.
A mulher de Ohio, nos Estados Unidos, que aos 90 anos decidiu se matar quando foi notificada de que havia perdido sua casa, onde havia vivido por 38 anos, foi um caso relativamente benigno se comparado com o do consultor financeiro, nascido na Índia, Karthik Rajaram, que foi encontrado morto junto com sua esposa, seus três filhos e sua sogra, depois de ter perdido tudo o que tinha, até o emprego, conseqüência do colapso financeiro.
Numa carta na qual prenunciava o próprio suicídio e os cinco assassinatos, Karthik sinalizava como causa a incapacidade de superar com vida os efeitos do fracasso de seus negócios, para ele e para sua família.
"São conseqüências da crise, que multiplicarão os suicídios e os transtornos mentais", anuncia alarmada Margaret Chan, diretora da OMS.
Para esta entidade, o suicídio é um indicador de um problema de saúde pública e traz à tona riscos psico-sociais tão graves como os que põem em perigo a integridade física das pessoas, portanto, deve-se deixar de considerar o suicídio como tabu ou como exclusivamente efeito de uma crise.
Pesquisas realizadas na Colômbia confrontam-se entre as que dão conta de que os colombianos são os mais felizes da América Latina e as que apontam para altos índices de suicídio associado a uma surpreendente cifra de transtornos mentais atribuídos à violência. A pesquisa do ministério de Saúde sobre a saúde mental na Colômbia revela que 26 milhões de colombianos tiveram relação com alguma ameaça, seqüestro, homicídio, morte natural ou acidental, ou algum suicídio, e que este fato proporcionou um sentimento de raiva em 24,5% das pessoas, de desolação em 37,7% e amargura em 8,6%.
Tem a ver essa situação com esses 1771 suicídios registrados em 2007? Segundo explicam as autoridades, os grupos mais propensos ao suicídio na Colômbia são os maiores de 60 anos e as crianças a partir de 10 anos. Nestre grupo infantil, o suicídio é a terceira causa de morte. Desde 1918, quando o país registrou com surpresa o suicídio de um garoto de 10 anos, a situação mudou para pior.
Os especialistas discutem, repassam estatísticas e histórias e propõem explicações: o suicídio de crianças tem a ver com a Internet? A surpreendente hipótese encontra apoio em dois feitos: a Internet isola, torna frágeis e quebradiços os vínculos com os demais. O contato virtual que causa é uma débil relação que não substitui o vínculo do encontro real com os outros; mas é mais contundente o outro fato que qualquer um que digita a palavra suicídio em mecanismos de busca pode comprovar. Entre as opções que se abrem aparece "técnicas de suicídio" ou modos de deixar a vida. Se põem ao alcance de qualquer solitário explorador.
Outros especialistas atribuem o aumento dos suicídios de crianças à violência familiar e esse fatos coincide com os que explicam suicídios de idosos por sua situação de abandono da vida social e familiar, e a violência que se exerce contra eles. As cifras são assombrosas: nos últimos dois anos quadruplicou o número de idosos vítimas desta enfermidade social. Este é o termo que os especialistas usam para denominar essa atitude autodestrutiva que fica mais aguda nos tempos de crise na sociedade.
Ao lado dos especialistas que tratam de conjurar os demônios soltos da recessão e das quebras em cadeia, as autoridades da saúde pública têm acendido a luz vermelha pelo que pode acontecer com todas essas pessoas que desfrutavam dos outros em paraísos de consumo em que foram convertidos os países desenvolvidos e de altas classes.
Acostumados com as delícias que os créditos generosos colocavam ao alcance de suas mãos, as fáceis hipotecas e o dinheiro, hoje elas não conseguem resolver o conflito emocional que traz a venda do iate e a impossibilidade de reavê-lo; ou a substituição do carro de luxo por um mais modesto, ou a necessidade de abandonar o faustoso apartamento. Instalados em um modo de vida confortável que eles presumiam imutável e seguro, nunca elaboraram um plano B que lhes serviria de alternativa.
Em 1929, pela falta desse plano, algumas das vítimas da quebra geral optaram por saltar das janelas, como os indígenas que partiam em massa para os abismos ou se enforcavam diante da quebra que significava para eles o domínio do invasor espanhol; ou como os romanos que expunham no senado suas razões para deixar a vida, como o argumento para obter licença de suicídio.
Diante desta quebra do valor da vida - que não tem ações em Bolsa, mas que explica o que ali se joga - a OMS e todos os que velam pela saúde humana enfrentam a necessidade de um plano B, que seja uma alternativa ao desespero dos novos pobres: pôr ao seu alcance motivações para viver que não sejam o dinheiro; valores de sobrevivência em meio à crise, ou simplesmente, um pouco de esperança.
Fonte: Terra Magazine
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Lembrando...
Número de suicídios no país preocupa Ministério da Saúde
05.06.2007 - Suicídio vira questão de saúde pública
Brasil, que está entre os países com maior número absoluto de casos, enfrenta o problema com políticas de prevenção e apoio a quem apresenta riscos
Tema que questiona a existência drasticamente e conseqüência da falta total de esperança, o suicídio começa a ser encarado pelo Ministério da Saúde (MS) como um problema de saúde pública e, por isso, ganha ações preventivas. No Brasil, são 4,5 casos para cada 100 mil habitantes. Apesar de essa média estar longe da amostra de países como Japão, onde a taxa é de 25 mortes por 100 mil habitantes, o Brasil se enquadra na lista dos dez países com maiores números absolutos de suicídio, já que é muito populoso.
Em 2004, foram 7.987 suicídios no País, o que representou 0,8% do total de óbitos do ano em questão. “A cada ano, um milhão de pessoas em todo o mundo é vítima da morte voluntária. Exatamente um indivíduo anula a vida a cada 40 segundos”, diz o psiquiatra Humberto Correa, presidente do 2º Congresso Latino-americano de Suicidologia, que será sediado em Belo Horizonte, entre os dias 28 e 30 de junho.
Por essas dimensões críticas, já em 1999, a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou o Programa de Prevenção do Suicídio (Supre, em inglês), com o objetivo de alertar a população em geral. Agora, o MS está prestes a concluir um plano inédito no Brasil chamado de Amigos da Vida. Trata-se de uma estratégia nacional de prevenção do suicídio (veja mais na página 16). “Será o primeiro país da América Latina a adotar uma ação preventiva”, acrescenta Humberto.
Na lista das estratégias brasileiras, está o alerta em relação aos fatores de risco. “Desde o ano passado, quando o ministério começou a falar sobre um plano para reverter os suicídios e as tentativas, os médicos estão mais preocupados com a situação. Já se sabe que é preciso investigar se o paciente tem pensamentos suicidas de forma serena e sensata”, assegura o psiquiatra Paulo Tavares de Lima, do Hospital Ulysses Pernambucano, onde muitos pacientes possuem condições mentais associadas ao comportamento suicida. Por isso, garante Paulo, a equipe de saúde fica sempre atenta.
“Um transtorno mental encontra-se presente na maioria dos casos”, garante o médico Neury José Botega, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Num artigo da Revista Brasileira de Psiquiatria, de março deste ano, ele revela que uma revisão de 31 artigos científicos publicados entre 1959 e 2001, que englobou cerca de 15,6 mil suicídios na população geral, mostrou que caberia um diagnóstico de transtorno mental, durante o ato fatal, em 97% dos casos.
Aproximadamente 10% dos indivíduos que sofrem de esquizofrenia falecem por suicídio. “Tenho um irmão psicótico com 27 anos e que entrou em depressão na adolescência. Passou a usar drogas e se tornou agressivo. Nossa família o incentivou a fazer tratamento, mas ele nunca finalizou as etapas das terapias”, conta o profissional autônomo P.G. “Um dia, ele avisou que iria caminhar. Mas saiu para tentar suicídio. O fato não foi consumado, mas ele teve fratura externa e se recusa a fazer fisioterapia. Agora é que começa a voltar a andar.”
Embora os transtornos mentais sejam o fator de risco mais grave, os especialistas frisam a necessidade de derrubar o mito de que, para o suicídio acontecer, necessariamente existe um problema de ordem psiquiátrica. “Há uma falsa idéia de que apenas os esquizofrênicos se suicidam”, alerta Paulo.
Aqueles que têm transtornos de humor, de ansiedade e de personalidade chamam a atenção dos especialistas. Também estão na linha do perigo indivíduos que sofrem perdas de parentes, que têm dinâmica familiar conturbada ou que apresentam impulsividade.
Mas os especialistas enfatizam que, de todos os sinais de perigo, a depressão é o indício mais grave. “É a primeira doença de risco para a auto-anulação da vida. Entre as pessoas gravemente deprimidas, 15% se suicidam”, destaca o médico psicoterapeuta Dival Cantarelli, com base em estatísticas da OMS. À frente do Centro de Pesquisa em Qualidade de Vida da Universidade de Pernambuco (UPE), ele diz que o ponto positivo da estratégia do ministério é o trabalho de esclarecimento dos profissionais de saúde sobre a importância de se detectar precocemente as condições mentais associadas à prática do suicídio.
A depressão é traiçoeira porque pode deixar o pessoa sem esperança e, assim, surge o pensamento suicida. “O deprimido tem auto-estima diminuída e fica impotente. A morte, então, é encarada como a única forma de fugir do sofrimento de que não se tem controle”, enfatiza Paulo.
De acordo com ele, muitos suicidas têm dificuldade para fazer uma conexão entre a existência e o sofrimento. “A capacidade de discernimento e de crítica é restrita quando se tem pensamentos suicidas e, assim, geralmente o paciente não está consciente do que faz. Ele não tem certeza de que deseja morrer mesmo”, continua o médico. “Há um desejo de viver, mas não a vida que encara, e sim outra vida sem sofrimentos”, teoriza Dival Cantarelli.
Um dos detalhes que dificultam para a família e os médicos desconfiarem de que o depressivo pode ter a intenção de se matar são os episódios de depressão discretos e até mascarados. “Um quadro que soma falta de motivação para realizar atividades do dia-a-dia, distúrbios do sono, falta de apetite, além de comprometimento da auto-estima e da esperança pode mascarar uma possibilidade de suicídio”, avisa Dival.
Trata-se de um panorama que se apresenta como um fantasma que a família não consegue enxergar, principalmente num caso de transtorno afetivo bipolar (TAB), problema que atinge 1,5% da população e é caracterizado por alternância de fases de depressão e de hiperexcitabilidade. Em situações desse tipo, a elevação da angústia é um dos indícios. “É uma doença associada a um maior risco de suicídio”, afirma Humberto Correa.
O caso do advogado aposentado Manoel Fernandes Maia, 58 anos, vítima do TAB e do transtorno obsessivo compulsivo (TOC), elucida a teoria. Há dois anos, quando enfrentava crises intensas, ele pensou em se suicidar. “No momento final, desisti. Não sei bem por quê, mas acredito que minha religiosidade me ajudou a não cometer o ato. Posso dizer que se trata de um pensamento diabólico, que ninguém deveria ter”, conta Manoel, que está com as doenças controladas há um ano.
Ele explica que pensou em suicídio porque entrou em depressão grave e só enxergava a morte como saída. “Mas percebi que é uma fuga covarde. Então, busquei ajuda para me transformar numa fênix, uma ave que, segundo a tradição egípcia, durava muitos séculos e, ao ser queimada, renascia das próprias cinzas”, revela Manoel, que batizou de Fênix o livro recém-lançado em que ele escreveu detalhadamente as perturbações dos portadores de TAB e TOC.
Sobre as estatísticas, o médico psicossomatista e psicoterapeuta Meraldo Zisman alega que os suicídios geralmente são registrados como acidentes fatais. “Por isso, não se pode ter um panorama que espelhe a realidade”, complementa o médico psicossomatista e psicoterapeuta Meraldo Zisman. Em relação às tentativas, os registros oficiais são mais escassos e menos confiáveis que os dos autocídios consumados. Estima-se que o número de tentativas supere o número de suicídios em, pelo menos, dez vezes. Ao considerar o sexo, os homens praticam mais suicídio que as mulheres.
Fonte: UOL notícias (jornal do Commercio)
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Nota do Portal Anjo, www.portalanjo.com
Nos Dez Mandamentos, encontramos um que diz: “Não matarás” (Ex 20,13). É certo que a expressão negativa enfática de não matar se refere às mais variadas formas que levam à morte. Dentre elas, lembramos do assassinato, da eutanásia e do aborto. O suicídio também é considerado como a quebra desse mandamento, tendo em vista que significa autodestruição, ou negação da própria vida. O termo se origina do latim sui, que quer dizer a si mesmo, e caedere que significa cortar, matar.