10.10.2008 - Se há alguém que nos pode relatar com seriedade o estado da vida na Terra, especialmente, na perspectiva do aquecimento global, esse é Edward O. Wilson (1929), um dos maiores biólogos vivos, introdutor da palavra biodiversidade.
Seu livro "A Criação. Como Salvar a Vida na Terra" (Companhia das Letras, 2008) representa um apelo preocupado, diria até desesperado, para que façamos esforços ingentes e coletivos para sairmos da crise que nós próprios criamos.
A Terra, em sua longa história, conheceu cinco grandes dizimações, a última no final da era mesozóica (dos répteis), há 65 milhões de anos, na qual todos os dinossauros desapareceram. Deu lugar à era cenozóica (a nossa, dos mamíferos). Entre uma dizimação e outra, a Terra precisou de 10 milhões de anos para se auto-regenerar.
Segundo Wilson, nos últimos séculos, os seres humanos, no seu afã de construir bem-estar e de se enriquecer, exploraram de forma tão persistente e sistemática o planeta Terra, que começou, como conseqüência, a sexta extinção em massa. Abstraindo dos meteoros rasantes que devastaram o planeta mais ou menos a cada cem milhões de anos, a Terra nunca conheceu um ataque tão poderoso como o que está ocorrendo atualmente. Diz-nos Wilson: "No momento, a taxa global de extinção das espécies supera o nascimento de novas espécies numa proporção de pelo menos cem por um e logo vai aumentar para dez vezes mais do que isso" (p. 98).
O causador dessa devastação é o ser humano que se transformou numa verdadeira força geofísica destruidora: alterou a atmosfera e o clima da Terra, difundiu milhares de substâncias químicas tóxicas pelo mundo inteiro, represou quase todos os rios, transformou quase todas as terras em aráveis, estando hoje vastamente desertificadas, e nos encontramos perto de esgotar a água potável.
Sabemos que é a biodiversidade, especialmente dos microorganismos, bactérias, fungos, pequenos invertebrados e insetos que garante as condições para que nossa vida humana possa continuar. Nós dependemos totalmente deles. A continuar nossa prática biocida, a partir dos meados deste século, começará a dizimação de nossa própria espécie. Ela não estará na lista das condenadas à extinção? Desta vez, não dá para esperar 10 milhões de anos para a Terra recuperar seu equilíbrio perdido. Nós temos que ajudá-la, do contrário, Gaia nos expulsará como um corpo letal.
É neste contexto que Wilson propõe Uma Aliança pela Vida. Convoca as duas forças que para ele são as mais poderosas do mundo: a ciência e a religião. Seu livro é, na verdade, uma carta aberta a um pastor evangélico, convidando-o a somar forças, a desmontar preconceitos, a construir valores que possam salvar a vida. Wilson se confessa um não crente, digamos um ateu, mas que fala sempre com reverência de Deus. Vai bater na porta da Igreja para pedir socorro. Diante de um perigo global, anulam-se as diferenças. Desta vez, crente e não crente terão o mesmo destino. Mas ambos podem trabalhar juntos porque "os que hoje vivem na Terra têm de vencer a corrida contra a extinção das espécies, ou então serão derrotados - derrotados para sempre; eles conquistarão honrarias eternas ou o desprezo eterno" (p. 115).
Ciência e religião devem mudar. A ciência até hoje não respeitou a alteridade dos seres. Colocou-se acima, dominando-os. A religião não se livrou ainda de seu fundamentalismo na leitura dos textos sagrados. Mantendo sua fé, pode reconhecer a evolução das espécies. Ela contribui com a reverência diante da grandeza do universo e com respeito diante de todas as formas de vida. Essa atitude converte o poder em proteção e cuidado. Essa aliança sagrada poderá salvar a vida ameaçada.
Fonte: O Povo