02.10.2008 - Entrevista ao arcebispo Ravasi, às vésperas do Sínodo da Palavra
Por Paolo Centofanti
CIDADE DO VATICANO, quarta-feira, 1º de outubro de 2008 (ZENIT.org).- O arcebispo Gianfranco Ravasi, máximo expoente vaticano para a cultura, constatou um novo interesse pelas Sagradas Escrituras, assim como o desejo de apoiar seu estudo e análise.
Assim confirma uma recente pesquisa sobre o conhecimento da Bíblia pelos fiéis e pelo projeto que, na emissora RAI (http://www.labibbiagiornoenotte.rai.it), prevê a leitura de textos bíblicos, de 5 a 11 de outubro, por parte de uma série de leitores, que será iniciada e encerrada por Bento XVI. A iniciativa surge por ocasião da inauguração da assembléia geral do Sínodo dos Bispos sobre a Palavra, em 5 de outubro.
No outros 7 dias, intervirão expoentes das comunidades que baseiam sua religião no Antigo Testamento, como o rabino chefe da comunidade judaica. Os fiéis poderão intervir inscrevendo-se pela internet.
Sobre isso, Zenit entrevistou Dom Gianfranco Ravasi, presidente do Conselho Pontifício para a Cultura e da Comissão Pontifícia para os Bens Culturais da Igreja, que explicou o projeto e comentou os resultados da análise.
– Há pouco tempo, foi apresentada no Vaticano uma pesquisa social sobre a Bíblia e seu conhecimento. O senhor pode nos dizer quais foram as motivações e os objetivos desta pesquisa?
– Dom Ravasi: Esta pesquisa foi efetuada pela Federação Bíblica Católica Internacional, que é uma instituição independente ligada ao Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos.
É uma pesquisa realizada sobretudo em conexão com o Sínodo dos Bispos, que neste ano se dedica precisamente à Bíblia.
A pesquisa pretendia também indagar a situação atual, passados mais de 40 anos ddesde o Concílio Vaticano II, que marcou uma espécie de renovação no uso da Bíblia por parte dos católicos e da Igreja Católica.
A Bíblia era certamente conhecida com antecedência, sobretudo mediante a liturgia, a catequese, mas não de uma maneira tão sistemática e contínua como se deu depois, sobretudo após aquele documento fundamental que foi a Dei Verbum, o texto sobre a divina revelação do Concílio Vaticano II.
Este é, portanto, o principal fim: conseguir de alguma forma fazer uma prova sobre a sensibilidade referente à Bíblia nas comunidades eclesiais de 9 países, aos quais se acrescentarão dentro de pouco outros 4, para poder ter uma visão articulada e completa da relação entre a Palavra de Deus e as comunidades.
– Quais foram os resultados da pesquisa?
– Dom Ravasi: Tenho que dizer que os resultados foram muito articulados, precisamente porque o esquema e a estrutura da pesquisa foram bem estruturados, entrando inclusive em aspectos inéditos, e a amostra era muito ampla.
Podemos dizer que são resultados interessantes e com fundamento, naturalmente com todos os limites que os resultados têm.
Poderíamos fazer ao menos duas considerações com base neste conjunto enorme de dados.
A primeira é que, certamente, em alguns países ainda há uma distância notável do texto sagrado, da Bíblia, com relação a outros.
Para dar um exemplo de modelo desta pesquisa que pode ser significativo, está a pergunta sobre a leitura de uma página bíblica durante o último ano.
Nos Estados Unidos, 73% da população leu um texto bíblico no último ano, o que quer dizer quase a totalidade daqueles que têm o hábito da leitura. Por outro lado, se observarmos a Itália, veremos que só 25% dos leitores abriram uma página bíblica no último ano.
Este é um exemplo. As respostas são, como se vê, muito variadas e em alguns países o caminho que se deve percorrer é muito longo.
Curiosamente, um dos últimos países, que surpreende porque é um país católico de grandes tradições, mas que provavelmente marca uma espécie de hiato com seu passado, é a Espanha, que aparece quase sempre em último lugar neste estudo.
A segunda consideração é que ainda há em muitos o desejo de voltar a este texto, sobretudo considerando-o não só, como é óbvio para o crente, norma de vida, lâmpada para os passos no caminho da vida (para usar uma frase da própria Bíblia), mas inclusive como grande texto da cultura; aquilo que se costuma dizer «o Grande Código», usando esta expressão do poeta e pintor inglês William Bake, que foi recuperada pelo grande crítico canadense Norton Frye, que a converteu em título de um ensaio seu muito importante. «Grande Código» porque era o ponto de referência da cultura.
E aqui quero citar um elemento muito significativo: na Itália, um número notável de pessoas, 63%, exige que na escola seja introduzida a leitura da Bíblia.
– Hoje, 1º de outubro, se apresentará um projeto de leitura da Bíblia na televisão. O senhor poderia nos falar sobre isso?
– Dom Ravasi: Foi um projeto concebido sobretudo pela RAI (canal público da televisão italiana, N. da R..), que quis, por ocasião do Sínodo dos Bispos, propor de maneira integral as Escrituras do Antigo e do Novo Testamento.
Abrirá esta leitura, que durará uma semana, dia e noite, o próprio Papa, que lerá ao vivo a primeira página da Bíblia e das Escrituras judaicas e cristãs, ou seja, o primeiro capítulo do Gêneses.
Este texto será lido depois em hebraico pelo rabino chefe de Roma, para ter também o testemunho da comunidade centrada nas Escrituras do Antigo Testamento.
Depois haverá vozes das diversas confissões cristãs e de todos aqueles que, considerando significativo seu desejo de proclamar este texto, o lerão.
Naturalmente, serão passagens já definidas, os leitores se inscreverão pela internet e se começará este longo itinerário que tem, sobretudo este fim: propor a Palavra, uma palavra que ressoa solenemente em meio às muitas conferências que a própria televisão oferece e nas quais o mundo está submergido, até converter-se em uma espécie de zumbido, ruído de fundo da civilização contemporânea.
Estas, ao contrário, são palavras que, de algum modo, ferem e atravessam o costume, introduzem mensagens e por isso é significativo que a Palavra seja lida nesta forma conjunta, de tal modo que não se conceba apenas como um elemento religioso, mas como um verdadeiro testemunho cultural, de civilização, de humanidade.
Tanto é assim que, se um não-crente, um ateu, um agnóstico ou inclusive um muçulmano ou pertencente a outra religião desejar proclamar esta palavra, não se excluirá sua participação.
O importante é que esteja inscrito a esta longa voz sem interrupção que a Palavra de Deus propõe para os crentes, o grande texto da cultura e da civilização ocidental para todos.
Fonte: www.zenit.org