21.02.2019 -
Por Padre Marcelo Tenorio (do artigo: A Conta, o Tempo e a Música)
O homem que busca “imortalizar-se” em suas obras, naquilo que constrói. Mas, o que encontramos nos sepulcros quando os abrimos? Pó, apenas pó. Reis e plebeus, simples e nobres, papas e imperadores… Ao abrirmos os seus sepulcros, o que encontramos? Pó envolto em alguma seda já acabada pelo tempo, já decomposta pelos vermes.
Certa vez, visitando a capela dos ossos em Évora – capela toda decorada com ossos e crânios – vislumbrei uma frase, logo na entrada. Frase que depois descobri noutros cemitérios antigos: "Nos ossos que aqui estamos, pelos vossos esperamos!”
Somos pastos de vermes. Parece-nos uma tragédia, uma lembrança terrível que nos poderia causar uma angústia espiritual, se entendermos este pó, este nada, para aquém do que vemos, e que, por graça, fomos chamados a ser.
Então, quando a Igreja lembra que o homem é pó, e que ele será pó, ela quer dizer que ele é, humanamente, apenas isso: pó. Se ele vive na carne, se ele se fixa na carne, aí está a sua tragédia. Será aquilo que já é: nada e pó.
Nos dias que antecederão a Santa Quaresma, teremos a “festa da carne”, o Carnaval ,o “reinado de Momo” e justamente-aqui deveríamos pensar na efemeridade da vida.
Memento Mori! – Lembra-te que morrerás!
E mais uma vez a cerimônia tocante das cinzas! – que deveria impregnar a alma de todos com um sincero desejo de retorno para Deus – quando o sacerdote, usando vestes de penitência, impõe, em nossas cabeças, as sagradas cinzas com uma admoestação severa e solene:
”Memento homo quia pulvis es et in pulverem reverteris” (Gn 3, 19)
“Lembra-te, ó homem, que és pó e que em pó te hás de tornar.
Santo Inácio de Loyola, falando sobre o objetivo central do homem nesta terra, dizia ter sido o homem feito para “amar a Deus e salvar a sua alma”.
“Amar a Deus e salvar a alma”, deveria ser para todos a única preocupação iminente durante a vida inteira, já que fomos criados para Deus e, perde-lo, por culpa, significa a falência completa, a infelicidade eterna.
Como salvar a nossa alma? Praticando os mandamentos! E todos estão contidos no primeiro: ”Amar a Deus sobre todas as coisas!”
Estamos vivendo em tempos piores do que o do dilúvio. Nesses dias verdadeiramente das trevas, a humanidade rompeu com seu Criador, a criatura torna-se senhor de sua própria existência. Deus é banido da sociedade e das leis do Estado. Cresce uma nova humanidade que brada aos quatro ventos o seu laicismo: sem religião, sem Deus, sem nada.
No carnaval, festa pagã e da carne, afloram, de maneira mais escancarada todas as inclinações para o mal. E se existe alguma barreira ainda não rompida, o espírito carnavalesco corrói sem muitas dificuldades toda e qualquer resistência, visto que é comum nesses dias de folia, a abolição de toda ou quase toda moralidade.
Não preciso aqui lembrar como os santos enxergavam essa festa e como condenavam veementemente esses dias de folia. E olha que eles viveram em tempos remotos, mais tranquilos, quando não havia, ainda, o total declínio dos valores. O que diriam eles hoje?
Os santos levaram a sério a sua meta: “amar a Deus e salvar a alma”. Sabiam eles que tudo isso aqui era passageiro e que, cedo ou tarde, estariam diante de Deus para um julgamento contra o qual ninguém poderá escapar.
Vivemos no cronos e nele devemos melhorar a cada instante, renunciando sempre ao mal, crescendo na prática das virtudes e eliminando o que não presta em nós.
Paulo gostava de comparar a vida espiritual, à busca da santidade, que exige renúncias, com o atleta que prepara-se a vida inteira, no labor constante, para poder ganhar a coroa da vitória. Ora, se alguém é capaz de fazer isso por glórias passageiras, não deveríamos nós, cientes do nosso fim terreno, já que somos pó, empenharmos para , amando a Deus sobre todas as coisas, salvar a nossa alma?
Fala-nos a “Imitação de Cristo”:
“Mui depressa chegará teu fim neste mundo; vê, pois, como te
preparas: hoje está vivo o homem, e amanhã já não existe.
Entretanto, logo que se perdeu de vista, também se perderá da
memória. Ó cegueira e dureza do coração humano, que só cuida
do presente, sem olhar para o futuro! De tal modo te deves haver
em todas as tuas obras e pensamentos, como se fosse já a hora
da morte. Se tivesses boa consciência não temerias muito a morte.
Melhor fora evitar o pecado que fugir da morte. Se não estás
preparado hoje, como o estarás amanhã? O dia de amanhã é
incerto, e quem sabe se te será concedido?..” ( Cap 23)
É no cronos que devemos militar para salvar a nossa alma, pois na eternidade estaremos para sempre como sairmos deste mundo. Na amizade de Deus ou Dele afastados eternamente.
Frei Antônio das Chagas, em sua Antologia Poética, nos fala sobre o Cronos que nos foi dado e que dele, um dia daremos conta:
“Deus pede estrita conta de meu tempo.
E eu vou do meu tempo, dar-lhe conta.
Mas, como dar, sem tempo, tanta conta
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para dar minha conta feita a tempo,
O tempo me foi dado, e não fiz conta,
Não quis, sobrando tempo, fazer conta,
Hoje, quero acertar conta, e não há tempo.
Oh, vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passatempo.
Cuidai, enquanto é tempo, em vossa conta!
Pois, aqueles que, sem conta, gastam tempo,
Quando o tempo chegar, de prestar conta
Chorarão, como eu, o não ter tempo…”
Quando eu estudava num famoso colégio de freiras de congregação belga, nos intervalos de aulas tocava-se musica pelo som que cercava o enorme prédio. De uma aula para outra, uma música de piano e orquestra. A diferença estava no término do recreio, pois a música era sempre a mesma: o Guarani, de Carlos Gomes. Sempre! Todo dia. Acontecia que nos acostumávamos com a música e inconsciente aprendíamos o seu tempo. Assim que tocava imponentemente, ficávamos onde estávamos: uns jogando, outros lanchando, outros conversando…Quando a música chegava ao segundo plano, entendíamos que devíamos caminhar, concluir; automaticamente, íamos fazendo. E quando chegava na terceira e última parte, onde os acordes ressoavam em nós como trombetas apocalípticas, o fim estava iminente, rapidamente nos dirigíamos à sala de aula. Parada a música, portas fechadas; quem estava fora não mais entrava, quem estava dentro não podia mais sair! Mas, ai do funcionário desavisado que, em vez de por “ O Guarani”, colocava outra! Transtorno geral! Terminava a música e o colégio inteiro fora das salas, balbúrdia, confusão, desordem completa!
Assim a nossa vida sobre a terra. Uma música em três tempos. Já a conhecemos e sabemos que não mais que três. No primeiro a saída, no segundo a construção, no terceiro o retorno com os frutos! Disso sabemos! A sabedoria consiste em perceber a transição de um tempo para o outro. Perigoso achar que se encontra no segundo tempo, quando na verdade, é o terceiro que já se iniciou. Mas o mais perigoso ainda é não entender que esses tempos podem ser interrompidos a qualquer instante.
Diferente do meu colégio, ninguém poderá mudar a música , será sempre a mesma, mas poderá sim, ter interrompido o Tempo.
Bem cedo chegará o nosso fim. Bem cedo a música será concluída. É necessário ouvidos atentos capazes de perceber os últimos acordes que, como trombetas finais, ressoarão em nossa alma a nos falar: “ Santifica-te, Santifica-te, Santifica-te!
Visto em: www.padremarcelotenorio.com
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Nota de www.rainhamaria.com.br
São Camilo de Lélis, ao aproximar-se de alguma sepultura, fazia estas reflexões: "Se estes mortos voltassem ao mundo, que não fariam pela vida eterna?"
Disse São Lourenço Justiniano: "Sabes que necessariamente hás de morrer. Se já estivesses morto, que não desejarias ter feito por Deus? Portanto, agora que vives, pensa que algum dia cairás morto".
E eu, que disponho de tempo, que faço eu por minha alma? Este Santo pensava assim por humildade; mas tu, querido irmão, talvez com razão receies ser considerado aquela figueira sem fruto, da qual disse o Senhor: “Três anos já que venho a buscar frutas a esta figueira, e não os achei” (Lucas 13,7).
Tu, que há mais de três anos estás neste mundo, quais os frutos que tens produzido? Considera — disse São Bernardo — Que o Senhor não procura somente flores, mas quer frutos.
"Eu ouvi uma voz do céu, que dizia: Escreve: Felizes os mortos que doravante morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, descansem dos seus trabalhos, pois as suas obras os seguem". (Apocalipse 14, 13)
Assim tremia Santa Maria Madalena de Pazzi, que respondeu ao confessor que a animava: “Ah padre, é coisa terrível o ter que comparecer perante o tribunal de Jesus Cristo!”
Tremia o Venerável Luiz da Ponte, e tremia tanto que fazia também tremer o quarto onde estava. E tu, meu irmão, que dizes? Que fazes? Se neste momento o Senhor te deixasse morrer e te citasse a seu Tribunal, que havias de responder? Amei a Deus e a meu próximo?
In his duobus mandatis universa lex pendet et prophetae – “Nestes dois mandamentos está encerrada toda a lei e os profetas”. (São Mateus 22, 40)
Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje; porque o dia de hoje passa e amanhã virá talvez a morte que te impossibilitará de fazer algum bem e de remediar o mal. Numa palavra, mister é que prepares as contas, antes que venha o dia das contas. Entretanto, conclui o Evangelho, se puderes dar esmolas, com as riquezas iníquas faze dos pobres os teus amigos; para que quando necessitares, te obtenham de Deus a graça de uma boa morte, e assim te recebam nos tabernáculos eternos.
"Então o Rei dirá aos que estão à direita: - Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo, porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes; nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim. Perguntar-lhe-ão os justos: - Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de beber?
Quando foi que te vimos peregrino e te acolhemos, nu e te vestimos?
Quando foi que te vimos enfermo ou na prisão e te fomos visitar?
Responderá o Rei: - Em verdade eu vos declaro: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes". (São Mateus 25, 34 -40)
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