O drama dos católicos fiéis: O Vaticano está vendendo a Igreja Católica na China


17.04.2018 -

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O acordo entre a Santa Sé e Pequim é o modelo do novo relacionamento do Vaticano com governos de esquerda no mundo inteiro: Rússia, Ucrânia, América Latina, entre outros.

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Por Luis Dufaur 

Em outubro de 2017, diplomatas vaticanos tentaram convencer bispos instituídos canonicamente pela Santa Sé a entregarem suas dioceses a bispos ilegítimos, submissos ao Partido Comunista Chinês. Dom Pedro Zhuang Jianjian, de Shantou (Guangdong), foi convidado por carta a entregar sua diocese a um bispo excomungado. Mas se recusou, declarando: “Aceito levar a cruz por desobedecer”.

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Em dezembro, Dom Zhuang foi retirado da sua diocese no sul do país e escoltado até Pequim, limitando-se a polícia a informar que “um prelado estrangeiro” o aguardava. Ficou “sob controle” — leia-se: preso. Apesar de sua idade avançada (88 anos), sua debilidade física e intenso frio em Pequim, foi-lhe negada assistência de um médico ou de um sacerdote.

Conduzido à sede da Associação Patriótica e do fictício Conselho dos Bispos da China — uma espécie de CNBB instituída pelo regime comunista —, Dom Zhuang foi interrogado pelos bispos ilegítimos Ma Yinglin, Shen Bin e Guo Jincai, presidente, vice-presidente e secretário-geral dessa “CNBB chinesa”. Foi também levado perante três representantes da Administração Estatal de Assuntos Religiosos.

Não obtendo os resultados visados, os agentes o conduziram até onde se encontravam o “bispo estrangeiro” e três sacerdotes do Vaticano. O “bispo estrangeiro” era Mons. Claudio Maria Celli, encarregado pela diplomacia vaticana das negociações com o Partido Comunista. Explicou que a Santa Sé deseja um acordo com o governo marxista, mediante a entrega de dioceses aos designados por Pequim, e pediu que Dom Zhuang entregasse sua Sé episcopal ao bispo ilegítimo José Huang Bingzhang, deputado no Parlamento (Assembleia Nacional do Povo). Dom Zhuang manteve sua recusa. Todas estas informações são de AsiaNews em 22-01-18.

Enquanto Dom Zhuang era chantageado em Pequim, a delegação vaticana se deslocava até Fujian, no sul do país, para tentar convencer o legítimo bispo diocesano de Mindong, Dom José Guo Xijin, a permitir que sua diocese fosse ocupada por Vicente Zhan Silu, bispo ilegítimo a serviço do regime comunista. Dom José Guo havia passado quase um mês encarcerado antes da Semana Santa de 2017, tendo os agentes do governo feito de tudo para que ele assinasse um documento aceitando “voluntariamente” a imoral proposta.

Após a mencionada tentativa de outubro, o Cardeal Zen, arcebispo emérito de Hong Kong e figura de maior destaque do episcopado chinês, fez chegar a Dom Sávio Hon Taifai, responsável na Cúria Romana dos assuntos chineses, um relatório sobre os brutais fatos. Dom Sávio levou o caso ao Papa Francisco, que prometeu estudar o assunto. O próprio cardeal, em carta publicada por AsiaNews (29-1-18), descreveu as violências que sofrera.

Ficava assim a impressão de que a investida tenderia a arrefecer, mas em dezembro ocorreu a nova pressão policialesca que relatamos acima. Dom Zhuang, em lágrimas, pediu ao Cardeal Zen que levasse ao Papa um relatório, na esperança de que ele interviesse. O cardeal aceitou a incumbência, apesar de recear que o Pontífice pudesse não querer receber a correspondência do prelado resistente.

Doente e debilitado, o cardeal Zen, de 85 anos, viajou de Hong Kong a Roma para chegar na hora da audiência geral do Papa, no dia 10 de janeiro. Ingressou inesperadamente durante a cerimônia, ocupando o lugar reservado aos cardeais. Num momento dramático, pôs a carta nas mãos do Santo Padre, acrescentando que viajara só para isso, e esperava que o Pontífice consentisse em ler a carta.

O cardeal ficou surpreso quando, no mesmo dia, o Papa Francisco mandou chamá-lo para uma audiência privada. Informou que havia lido a carta, e se explicou: “Eu falei para eles [seus colaboradores na Santa Sé] que não criem outro caso Mindszenty!”. O próprio cardeal divulgou esses fatos na citada carta de 29 de janeiro, e concluiu: “Ou se rende ou se aceita a perseguição. Pode-se imaginar um acordo entre São José e o Rei Herodes?”. Perguntado se “acredita que o Vaticano está vendendo a Igreja Católica na China”, respondeu: “Sim, absolutamente”. Segundo o jornal britânico “The Tablet” de 30-1-18, a sala de imprensa da Santa Sé reagiu de modo fora do comum e contradisse as palavras do Cardeal Zen.

Yi-Zheng Lian, professor na Universidade Yamanashi Gakuin, de Kofu (Japão), escreveu no “The New York Times” (8-2-18) que a política do Papa Francisco ante um governo ateu e comunista “não é inteiramente transparente”. Para o “The Wall Street Journal” (2-2-18), a imagem do Pontífice como “defensor dos oprimidos” está ficando sem sentido, e acrescenta que ele não ajuda os ucranianos invadidos pela Rússia, dá as costas aos católicos chineses perseguidos e se alia aos seus algozes. Um grupo de intelectuais católicos influentes de Hong Kong lançou uma petição internacional, visando impedir o iníquo acordo entre a Santa Sé e Pequim (Hong Kong Free Press, 15-2-18).

Simultaneamente, Dom Marcelo Sánchez Sorondo, chanceler das Pontifícias Academias de Ciências e Ciências Sociais, voltou da China afirmando que “os chineses são os que melhor aplicam a doutrina social da Igreja”. O Dr. Samuel Gregg, professor de filosofia política e diretor de pesquisas do Acton Institute, comparou a atual diplomacia do Vaticano com a moda dos anos 20 e 30. E acentuou que nessa época intelectuais progressistas e esquerdistas voltavam de viagem à URSS comemorando com elogios a “primeira grande experiência do comunismo”, enquanto a realidade era bem outra, com muitos milhões morrendo de fome. O escritor comentou as longas declarações de Dom Sánchez Sorondo (argentino muito próximo do Papa) como um sinal de que “a irrealidade e a incoerência reinam no Vaticano” (Law & Liberty, 8-2-18).

Uma nova Revolução Cultural

Em publicação no “The Catholic Herald” (31-8-17), o Pe. Alexander Lucie-Smith, doutor em moral e teologia, perguntou: “Como é possível que o Vaticano negocie com a China, que continua demolindo as igrejas?”. A destruição sacrílega mais recente foi documentada em Yining, diocese de Urumqi, no noroeste do país. Cruzes, estátuas, torres dos sinos, relevos religiosos, cruzes do cemitério e do interior do templo, incluindo a Via Sacra — tudo isso foi destruído. Análogos atentados foram perpetrados contra as igrejas de Manas e Hutubi, na mesma diocese, segundo noticiou UCANews (1-3-18). Em Yining tudo foi destruído enquanto as delegações chinesa e vaticana preparavam um “histórico acordo” para a nomeação dos bispos católicos pelo regime anticristão.

As profanações obedecem ao projeto do ditador Xi Jinping de “achinesar” a Igreja, submetendo-a às políticas do Partido Comunista, e ele o deixou bem claro no XIX Congresso do PC, em outubro de 2017: “A cultura […] deve ser aproveitada para a causa do socialismo, de acordo com a orientação do marxismo”. Acrescentou que a religião deve ter por isso uma “orientação chinesa” e se adaptar à sociedade socialista guiada pelo partido (“The Washington Post”, 18-10-17). O ditador definiu “achinesar” como a obrigatoriedade de “aderir e desenvolver as teorias religiosas, mas com características chinesas”. Um comentário se tem generalizado, enquanto se multiplicam esses episódios de perseguição religiosa: “É uma nova Revolução Cultural”, batizada agora de “achinesar”.

Perseguição religiosa e Igreja clandestina

Essa posição anticatólica de Xi Jinping deve ser avaliada não apenas como uma série de violências de caráter transitório, pois ele acaba de reformar a Constituição comunista, proclamando-se ditador sem prazo de mandato. Estaríamos assim diante de uma nova revolução cultural, cujas características não podem diferir muito do verdadeiro genocídio praticado por Mao Tsé-Tung. No campo religioso, tal revolução implicaria:

Aplicar o princípio da “independência”, significando ruptura com a Santa Sé;

Adaptar a religião à sociedade socialista, transformando-a numa força de propulsão comunista;

Resistir às “infiltrações religiosas do exterior”, banindo os símbolos religiosos, os missionários e as Ordens religiosas vindos de fora.

Assim sendo, já se podem ver com antecipação exemplos do que acontecerá aos católicos chineses, com a nova orientação comunista:

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O Cruzeiro, símbolo da Redenção, é qualificado agora como “infiltração religiosa proveniente do exterior”, e foi arrancado com satânico impulso na igreja de Yining;

O princípio de “independência” proíbe rezar, inclusive no interior dos lares. Se a polícia encontrar duas pessoas rezando juntas em sua casa, vai prendê-las e obrigá-las a passar por uma “reeducação”, que implica reclusão num campo de concentração.

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Hoje só está permitido o culto nas igrejas registradas na burocracia marxista, e nos horários fixados pelo governo. Um ato piedoso em outro lugar é tido como feito em “local ilegal” e sujeito a prisão, multas, e até expropriação do prédio.

Nas residências particulares, toda conversa religiosa ou oração ficou proibida.

Na porta das igrejas deve ser legível a proibição do ingresso aos “menores de 18 anos”. Crianças e jovens não podem participar nos ritos, receber catequese, instrução religiosa nem preparação para os sacramentos, explicou o Pe. Bernardo Cervellera, diretor da agência AsiaNews (2-3-18), do Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras.

Diplomacia vaticana favorecendo os carrascos

O Partido Comunista ficou como “guia ativo” das religiões. Sob a inspiração suprema de Xi Jinping, dependerá do PC a vida ou morte de qualquer entidade religiosa cristã, para o que não lhe faltará o apoio dos seus amigos do Vaticano, sempre tendentes à concessão. O controle ditatorial e asfixiante está sendo exercido através do medo. No passado recente, os católicos chineses já haviam enfrentado esse medo assassino e o venceram, mas desta vez a diplomacia vaticana se põe do lado dos carrascos.

Há uma renascença religiosa na China. Mais de 80% da população tem religião, e pelo menos uma quinta parte dos membros do Partido Comunista pratica alguma delas em segredo. Incapaz de convencer o povo com as ideias comunistas, o regime recorre a medidas de força. Mas, sendo essas insuficientes, apela para eclesiásticos ligados de um modo ou de outro à “Teologia da Libertação”. Disse um fiel de Urumqi à AsiaNews: “Estou muito triste pelo fato de o Vaticano se rebaixar ao fazer pactos com este governo. Agindo desse modo, ele se converte em cúmplice de quem quer a nossa aniquilação”.

Fonte: Revista Catolicismo, Nº 808, abril/2018.

Visto em: www.abim.inf.br

 

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