Esclarecimentos sobre: Padre Gonçalo Portocarrero escreveu um texto intitulado; os católicos protestantes, no qual tece várias críticas aos autores da Correção Filial a Francisco


05.10.2017 - Nota de www.rainhamaria.com.br

Do site português https://odogmadafe.wordpress.com

Publico uma parte deste artigo esclarecedor.

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Correcção filial ao Padre Gonçalo Portocarrero. (os termos lusitanos foram mantidos)

Por João Silveira e Pedro Froes

Como declaração de interesses começamos por dizer que o Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada é alguém por quem nutrimos uma grande amizade e admiração, pelo que tem escrito desde há longos anos, de tal maneira que já publicámos neste blogue [Senza Pagare] quase uma centena de textos da sua autoria.

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O Pe. Gonçalo Portocarrero escreveu um texto intitulado «Os católicos ‘protestantes’» no qual tece várias críticas aos autores da Correcção Filial ao Papa Francisco. O texto foi bastante difundido nas redes sociais, até por quem menos se esperava. Vivemos de facto tempos curiosos. Pessoas que durante décadas se referiam ao Opus Dei de modo violento, sempre recorrendo a adjectivos agressivos e injustos (mostrando total desconhecimento da Obra), partilham agora com todo o vigor um texto de um sacerdote numerário do Opus Dei. É uma situação análoga à dos que sempre atacaram a doutrina católica e os pronunciamentos infalíveis do Papa (como por exemplo a encíclica Humanae Vitae do Papa Paulo VI) e agora envolvem numa aura de infalibilidade qualquer coisa que diga ou faça o Papa Francisco. É o chamado passar dos 8 para os 80.

O Pe. Gonçalo começa por defender que os autores da Correcção, quando escrevem “propagação de heresias produzida pela Exortação Apostólica Amoris Laetita“, acusam directamente o Papa Francisco de heresia. Isto porque é impossível que uma heresia provenha de um texto que não seja explicitamente herético (negue uma verdade de fé que deve ser crida). Mas isto não é verdade. Se um texto for dúbio – tiver mais do que uma interpretação possível – pode propagar uma heresia (um erro) sem que o erro se encontre no texto. Por isso mesmo quem tem na Igreja o dever de ensinar sempre se esforçou para que os seus pronunciamentos, especialmente os que versam verdades tão importantes, fossem o mais claros possível, de modo que só pudessem ser interpretados do modo correcto. Não é isso que se passa com a Amoris Laetitia, que deixa espaço para diferentes interpretações. Daí a propagação de heresias proveniente do texto.

O Pe. Gonçalo avança depois para a afirmação que nenhum Papa pode ser deposto. Porém, não existe uma única linha na Correcção que verse a possibilidade de depor um Papa ou sobre a deposição do Papa Francisco (basta procurar no documento palavras como “destituir” ou “deposto” e ver que o resultado é zero). Essa intenção não está material nem formalmente expressa no documento, pelo que não se entende esta deriva no texto do Pe. Gonçalo.

De seguida o Pe. Gonçalo invoca o cân. 1404, que diz que a primeira Sé (isto é o Papa) não pode ser julgada por nenhuma autoridade humana. Mas os autores da Correcção Filial não têm como objectivo a instauração de um processo canónico contra o Papa. Não o querem julgar num tribunal, mas tão só que corrija de algum modo a sua conduta de forma que as heresias e a confusão que vagueiam livremente dentro da Igreja hoje em dia deixem de existir. Canonicamente um Papa é inatacável mas moralmente não. Ao longo dos séculos existiram Papas com condutas morais no mínimo duvidosas e nem a Igreja nem o Papado acabaram por causa disso. E seria absurdo vir justificar aquelas práticas pelo simples facto de terem sido feitas por um Papa. É querer a quadratura do círculo.

Diz depois o Pe. Gonçalo que os autores da Correcção se esqueceram que a Amoris Laetitia «não pretende ser um texto dogmático, nem normativo, mas pastoral e, por isso, a sua exegese deve ser feita em sintonia com o magistério e a tradição da Igreja e não contradizendo-os.»

A questão que se coloca é: Pode um texto pastoral apresentar contradições em relação à doutrina? Pode um texto pastoral deixar em aberto possíveis interpretações contra o que o Magistério sempre ensinou e contra a praxis seguida na pastoral da Igreja ao longo de 2000 anos?

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Usando a Amoris Laetitia como fonte de autoridade existem hoje em dia conferências episcopais inteiras que defendem publicamente, e na prática, disciplinas contrárias ao que a Igreja sempre defendeu e condenadas explicitamente, ainda há poucos anos, em documentos do Papa João Paulo II e do Papa Bento XVI. Como constatou o Cardeal Caffarra na carta que escreveu ao Papa Francisco em Abril deste ano: “O que é pecado na Polónia é bom na Alemanha, o que é proibido na Arquidiocese de Filadélfia é lícito em Malta.” Poderíamos ainda acrescentar que existem diferentes doutrinas dentro de outras conferências episcopais: por ex. em Roma, diocese do Papa, a interpretação que se encontra no site do Vicariato de Roma é de mudança depois da Amoris Laetitia, enquanto que em Florença a interpretação é a de que nada mudou. Quem tem razão afinal? Um acto que sempre foi considerado intrinsecamente mau depende agora da geografia? Pode ser pecado aqui mas já não ser acolá? Onde está a unidade da fé que é a causa da unidade da Igreja?

O Pe. Gonçalo explica depois, dando o exemplo da samaritana junto ao poço e dos seus 5 maridos, que também no Evangelho existem “expressões que não são susceptíveis de uma exegese literal”. Tem toda a razão. Por isso mesmo a Igreja sempre disse que deveria ser o Magistério a explicar o sentido das Sagradas Escrituras e não cada um por si, como fazem os protestantes. Foi para evitar o problema de “cada cabeça sua sentença” que a Igreja sempre esclareceu o significado das Escrituras e sempre o fez de maneira clara, sem margem para dúvidas de fé e moral.

Segue depois o Pe. Gonçalo para o exemplo de São João que apesar de ter sido o primeiro a chegar ao sepulcro vazio esperou por São Pedro para entrar, confirmando a autoridade deste em relação aos Apóstolos, mesmo tendo negado Jesus 3 vezes. Mais uma vez tem razão. Mas ocorre dizer que Pedro se arrependeu dessa negação chorando amargamente (Lc 22, 62) e, mais tarde, corrigiu a sua tríplice negação com uma tríplice confissão da fé, diante do Divino Mestre (Jo 21, 15-17).

Os autores da Correcção Filial não se consideram uma autoridade acima do Papa, antes têm a perfeita noção que é o Papa que tem a jurisdição sobre eles e sobre toda a Igreja. Por isso mesmo dirigem-se ao Santo Padre enquanto filhos e reconhecendo a sua autoridade, como está bem explícito no documento. E se o que escrevem tem alguma autoridade é a autoridade que vem da Revelação de Deus e de 2000 anos de Magistério ininterrupto da Igreja em relação à doutrina do matrimónio e às condições necessárias para receber os sacramentos.

Não existe qualquer infidelidade ao Papa nesta iniciativa, existe exactamente o contrário: uma fidelidade acompanhada duma preocupação pela salvação das almas. Infidelidade ao Papa, e a Nosso Senhor, seria enfiar a cabeça na areia sem se preocupar com a confusão reinante neste momento na nossa querida Igreja.

O Pe. Gonçalo tem uma boa intenção aparente: defender o Papa. Mas o que faz na prática é colocar o Papa num pedestal juntando-lhe super-poderes de infalibilidade em tudo o que diz e faz. Isto não é doutrina católica, é uma papolatria que deturpa o que a Igreja Católica sempre disse sobre o papado. O Papa é infalível em certos pronunciamentos e em determinadas situações, não é infalível em toda a sua conduta.

O Papa Paulo IV explica isso de forma bastante clara na Bula ‘Cum ex apostolatus officio’:

“O Romano Pontífice, que é o representante na terra do nosso Deus e Senhor Jesus Cristo, que detém a totalidade do poder sobre povos e reinos, que pode a todos julgar e por nenhum ser julgado neste mundo, pode, no entanto, ser contradito, se se verificar que se desviou da fé.”

O mesmo clarifica o insuspeito Joseph Ratzinger (futuro Bento XVI):

“Doutra parte, é possível e até necessário criticar os pronunciamentos do Papa, se não estiverem suficientemente baseados na Escritura e no Credo, ou seja, na fé da Igreja universal. Onde não houver nem a unanimidade da Igreja universal, nem o claro testemunho das fontes, não pode também haver uma definição que obrigue a crer. Faltando as condições, poder-se-á também suspeitar da legitimidade [de um pronunciamento papal].” (Das Neue Volk Gottes – Enwürfe zur Ekkleseologie, Düsseldorf: Patmos-Verlag, 1969, trad. por Clemente Raphael Mahl: O Novo Povo de Deus , São Paulo: Paulinas, 1974, p. 140)

São Paulo corrigiu São Pedro:

“Mas, quando Cefas (Pedro) veio para Antioquia, opus-me frontalmente a ele, porque estava a comportar-se de modo condenável.” (Gal 2, 11)

São Paulo, que era apenas um Bispo, corrigiu o Papa. São Tomás de Aquino resolve esta questão em Summa Theologiae, IIa, IIae, Q. 33, A.4. Será que Paulo julgou Pedro? Não. “Prima sedes a nemine iudicatur.” Paulo corrigiu Pedro filialmente, tal como o Cardeal Jacques Fournier e outros bons homens fizeram ao Papa João XXII, que, felizmente, no seu leito de morte se retractou e converteu.

A história da Igreja ajuda a desmontar o romance e a utopia que envolvem hoje em dia o papado, transformando o Papa no que não é nem pode ser. A constituição dogmática Pastor Aeternus, sobre o primado e infalibilidade do Papa, promulgada pelo Concílio Vaticano I ajuda a perceber melhor e a purificar-nos destas ideias de infalibilidade absoluta do Papa em tudo o que diz e faz, que são um absurdo olhando para o passado e um perigo para o futuro se forem tidas como verdadeiras.

O Santo Padre é o garante da unidade da Igreja porque é seu dever confirmar os seus irmãos na fé. A unidade da Igreja é a unidade da fé. A obediência ao Papa é obrigatória sempre que essa obediência não implique uma desobediência aos mandamentos de Deus.

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A figura do Sucessor de Pedro é tão importante para a Igreja que qualquer crítica que seja feita ao seu governo deve ser justificada por motivos gravíssimos e feita com o maior respeito possível. Quer-nos parecer que a Correcção Filial goza desses dois pressupostos.

O Pe. Gonçalo é um homem inteligentíssimo, brilhante jurista, grande orador e escreve muitíssimo bem. Custa-nos que tenha perdido esta oportunidade para fazer uma crítica ao documento em questão, especialmente nas partes em que o mesmo pudesse ter-se afastado da doutrina católica. Poderia também ter demonstrado que de facto aquelas 7 heresias não são hoje ditas abertamente por vários membros da hierarquia da Igreja com o silêncio conivente da Santa Sé. Se o tivesse feito esta iniciativa teria perdido todo o seu sentido. Infelizmente o Pe. Gonçalo desperdiçou energias com investidas contra o que o documento não diz, nem quer dizer (a célebre falácia do espantalho) e a defender o Papa de ataques que não lhe foram de modo algum dirigidos. Agindo deste modo não prestou um bom serviço à verdade nem à salvação das almas.

Rezemos pelo Papa Francisco e pela unidade da Igreja em torno das verdades reveladas por Deus, que são imutáveis, tal como nos garantiu Nosso Senhor: “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão-de passar.” (Mt 24, 35)

Este texto foi publicado originalmente no blogue Senza Pagare no dia 2 de outubro de 2017.

Nota da edição: o texto acima é da inteira responsabilidade dos seus autores, a presente edição destina-se apenas à sua divulgação. A imagem foi adicionada na presente edição, não fazem parte da publicação original.

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Nosso comentário (do site Dogma da Fé - Portugal)

Subscrevemos na íntegra o artigo acima. O Pe. Portocarrero tem sido realmente uma referência nacional, quer pela sua fidelidade ao magistério da Igreja, quer pelo seu brilhantismo intelectual. É precisamente por isso que o seu artigo «Os católicos ‘protestantes’» acaba por ter tanto de surpreendente quanto de desolador.

Se a exortação Amoris Laetitia é um documento “pastoral para ser interpretado à luz do magistério e da tradição da Igreja”,a verdade é que, na sua ambiguidade literária, serve de justificação para práticas pseudo-pastorais diametralmente opostas ao ensinamento da Igreja. Aliás, é o próprio Santo Padre quem tem promovido tais interpretações, enquanto condena publicamente aqueles que persistem na doutrina imutável da Igreja.

Já aqui tínhamos clarificado e voltamos a fazê-lo: a prática de Amoris Laetita, no sentido pretendido do conceito, significa obter/dar absolvição sacramental e receber/dar a Sagrada Comunhão apesar do adultério. É uma prática pastoral que, na sua essência, está em profunda contradição com a doutrina da Igreja Católica mas que o Papa Francisco tenta insistentemente impor, de forma incansável e obsessiva, desde o início do seu sinistro pontificado. O resto são eufemismos e outros malabarismos de linguagem utilizados por aqueles que aprovam aquilo que o próprio Cristo condenou.

A habilidosa argumentação daqueles que sustentam que a nova pseudo-pastoral não põe em causa a doutrina não passa de um grande sofisma, mas só engana quem quer ser enganado.

Entre “católicos protestantes” e protestantes católicos, pode ser que algum dia apareça um teólogo capaz de explicar tudo isto à luz daquela invulgar meditação sobre o “Cristo que se fez diabo“.

No dia 4 de abril, na capela da Casa de Santa Marta, o Santo Padre fez outra daquelas homilias que causam arrepios na espinha. Recorreu mais uma vez à figura da serpente para explicar o seu entender a respeito do verdadeiro significado da cruz, símbolo dos cristãos.

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Mas desta vez foi longe demais ao sugerir que, por nós, “Cristo tornou-se diabo” na cruz.

A cruz então, afirmou, «para algumas pessoas é um distintivo de pertença: “Sim, eu trago a cruz para mostrar que eu sou um cristão”». E «está bem» mas «não só como distintivo como se fosse uma equipa, o emblema de uma equipa»; mas, disse Francisco, «como a memória dele [Jesus] que se fez pecado, que se fez diabo, serpente, por nós; ele humilhou-se até ao ponto de aniquilar-se totalmente». (in News.va, 04/04/2017 – tradução)

 

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