03.08.2015 - Nota de www.rainhamaria.com.br
Por Dilson Kutscher
Recebi um testemunho da amiga Cristianne Cantreva, sobre a noticia que publiquei no site...
Oito em cada dez brasileiros têm medo de ser assassinados
Vou preservar sua cidade e estado.
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Prezado irmão em Cristo,
Infelizmente essa matéria é uma grande realidade e eu quero deixar o meu testemunho.
Antigamente quando via em uma reportagem um pai ou uma mãe chorando afirmando que a polícia havia matado seu filho(a) sem ao menos perguntar, que era trabalhador, honesto, eu dizia pra mim mesma. Pra família todo bandido é bonzinho.
Hoje Deus me fez ver de outra forma e me fez sentir na pele.
Desde que fora instalada uma UPP em bairro vizinho para fazer o policiamento de favelas existentes próximas a minha residência, vivemos em constante sofrimento e abusos.
Meu marido já foi abordado mais de três vezes e comigo fomos uma vez abordados juntos. Não temos o direito de falar absolutamente nada, eles nos apontam armas, nos ofendem, intimidam e desrespeitam.
Na penúltima abordagem que sofreu meu marido, até o lanche que ele levava para mim e nossa filha eles queriam pegar. Na última abordagem, saí da missa e recebi uma mensagem dele dizendo que o carro estava enguiçado. Fui ao seu encontro de carro e chamamos o reboque. Após solucionado o problema, quando ele me ultrapassou enquanto seguíamos para casa, a policia o abordou e a mim também. Os quatro policiais apontarem fuzis para o carro. Eu logo parei com o meu carro antes da viatura para defende-lo.
Após abrir o vidro, mesmo assim, vendo que era uma pessoa desarmada, eles continuaram apontando aquele armamento pesado. Meu esposo perguntou o motivo pelo qual apontava uma arma, pois ele era um cidadão de bem e não lhe oferecia risco. Ele disse: "A arma é meu instrumento de trabalho e eu faço com ela o que bem entender". Ele então mostrou seus documentos, e o mesmo policial disse. "Não te pedi nem te perguntei nada".
Quando vi a arma exclamei: "uma arma!!" O espanto de ver tamanha violência a um trabalhador, cidadão e contribuinte e ainda tive que engolir um deboche.
Outro dia pararam em frente ao meu portão e os cães começaram a latir. Minha mãe, uma senhora de 73 anos ficou olhando, ele começou a intimidá-la com o olhar. Eles pretendiam apontar suas armas para o morro do outro lado pois estavam desconfiando de uma pessoa que estava distante deles mais de 350 metros. Pediram para o vizinho sair dali que iriam atirar. Atirar em alguém primeiro pra depois saber. Como uma pessoa consegue distinguir um bandido a uma distância dessas?
Hoje mudo minha opinião e vejo o quanto as pessoas simples sofrem nas mãos desses "pseudos agentes da lei" que ao invés de proteger geram medo e pânico.
Nós ainda fizemos faculdades e conhecemos nossos direitos e eles nos tratam dessa forma, que dirá os mais humildes. Esses ficam sim a mercê dessas "autoridades".
É lamentável e caminhamos para o fim.
Tememos por nossos filhos e pelos menos favorecidos.
Eu confesso que tenho medo da polícia. Pra mim entre ela e os marginais há diferença só na farda.
Cristianne Cantreva
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Nota de www.rainhamaria.com.br
Matéria da Revista Época, de hoje, 03.08.2015
Policiais do Rio matam inocentes e ficam impunes, diz Anistia Internacional
Na noite de 11 de agosto de 2011, a juíza Patrícia Acioli foi assassinada a tiros por dois policiais militares na porta de casa em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. Os assassinos vingavam oito colegas de farda, presos por ordem da juíza, acusados de matar um adolescente de 18 anos. A morte do rapaz fora registrada como auto de resistência, no qual policiais alegaram ter atirado em legítima defesa, mas a juíza descobriu que o adolescente estava desarmado. Após o assassinato de Patrícia, esperava-se que a Polícia Civil investigasse com rigor as incursões da PM que terminaram em mortes, mas isso não aconteceu. Divulgado nesta segunda-feira (3), um relatório da Anistia Internacional aponta que, de 220 inquéritos abertos para investigar autos de resistência na cidade do Rio em 2011, apenas um resultou em denúncia à Justiça contra policiais. Passados quatro anos, outros 183 continuam em andamento, sem resultado, 12 foram arquivados e em 24 não se confirmou envolvimento com o homicídio.
"A Polícia Militar continua usando a força de forma arbitrária, desnecessária e excessiva, com total impunidade", diz o relatório da Anistia. O número de mortos em ações policiais vinha caindo desde 2011 porque, segundo especialistas, a pacificação de favelas reduziu o número de confrontos entre policiais e bandidos. A morte da juíza acentuou a queda ao chamar atenção das autoridades para a violência da PM fluminense. Em 2010, ocorreram 855 homicídios "decorrente de intervenção policial", como os autos de resistência passaram a ser chamados. Em 2011, caíram para 523, o que significou 332 vidas salvas.
>> Uma crise de confiança nas UPPs
Agora os casos aumentaram em 39%, passando de 416 homicídios em 2013 para 580 em 2014. A Anistia compilou as estatísticas dos últimos dez. É como se a população de uma cidade de pequeno porte, como Rio das Flores, na divida com Minas Gerais, desaparecesse do mapa: 8.466 pessoas morreram em operações da polícia entre 2005 e 2014. Se os autos de resistência sugerem confronto com criminosos, os agentes da lei têm levado vantagem na matança. No mesmo período, 236 policiais civis e militares perderam a vida em serviço. O trabalho da Anistia puxa os números para a questão racial ao perfilar 1.275 vítimas de homicídios das intervenções policiais entre 2010 e 2013 na cidade do Rio. "Frequentemente, o discurso oficial culpa as vítimas, já estigmatizadas por uma cultura de racismo, discriminação e criminalização da pobreza ", diz o relatório, informando que 99,5% eram homens, 79%, negros e 75% tinham entre 15 e 29 anos de idade. O relatório não traz um perfil dos PMs envolvidos.
Há uma concentração de violência policial na área do 41º Batalhão da PM, na zona norte, onde estão localizadas as favelas de Acari e dos complexos da Pedreira e Chapadão. Em 2014, 244 morreram em ações da polícia na cidade do Rio. Do total de vítimas, 68 (ou 28%) perderam a vida nessa região do 41º BPM. A Anistia analisou dez homicídios, de pessoas com idade entre 17 e 40 anos, na favela de Acari e concluiu que em nove casos existem fortes indícios de crime de execução. "Quatro vítimas já estavam feridas ou rendidas, quando policiais usaram armas de fogo de forma intencional para executá-las. Outras quatro foram baleadas e assassinadas sem nenhum aviso. E uma vítima estava fugindo da polícia", diz o relatório. Para chegar à conclusão, os pesquisadores entrevistaram familiares e testemunhas dos crimes, coletaram informações em registros das delegacias, nos atestados de óbitos e ouviram especialistas. "Ele era tão inocente que não usava drogas; não cheirava nem fumava. Tanto é que não saiu nada disso no laudo pericial. O próprio legista falou que a morte do meu filho tinha traços de execução”, disse a mãe de um jovem de 19 anos em depoimento à Anistia. O documento lembra que 25 anos atrás, em julho de 1990, ocorreu uma chacina com 11 mortos, sete deles menores de idade, que moravam na favela de Acari. Até hoje os homicídios continuam impunes. Na época, a Anistia apontou policiais militares como principais suspeitos.
O relatório menciona ainda que policiais militares usam na favela de Acari uma tática conhecida como Troia. Durante as incursões na comunidade, geralmente numa troca de tiros com traficantes, o policial invade a casa de algum morador da favela e fica escondido dentro, mesmo após a tropa bater em retirada. Entocado na casa, o policial espera avistar algum traficante andando na rua para alvejá-lo, relata a Anistia. Em muitos casos, inocentes são feridos. Em 2011, usando a tática, policiais militares atiraram em um rapaz de 18 anos na favela de São Gonçalo, na região metropolitana do Rio. Foi esse o crime que fez a juíza Patrícia Acioli decretar a prisão de oito PMs, levando ao seu assassinato em represália.
A Secretaria de Segurança Pública afirma que investiga e pune os abusos da polícia. Ao falar sobre o caso Amarildo de Souza, o pedreiro torturado e morto por policiais na favela da Rocinha, na Zona Sul, o governador Luiz Fernando Pezão disse que "corta na própria carne" e sua gestão já expulsou 1.800 policiais desde 2007. Na sexta-feira passada, policiais militares do Comando de Operações Especiais fizeram uma operação na favela de Acari. Eles prenderam seis pessoas, apreenderam cinco pistolas calibre 9 mm, uma granada, 1.200 quilos de maconha, um quilo de cocaína e quatro de haxixe. Segundo o Comando da PM, a operação foi motivada por informações que chegaram do Disque-Denúncia sobre o trafico de drogas.
Por meio de nota, o secretário José Mariano Beltrame considerou "temerária e injusta a divulgação" do relatório da Anistia "num momento em que vemos os níveis de criminalidade caírem no Rio". Beltrame afirma que a Secretaria de Segurança Pública estimula a redução dos casos de violência na polícia. "Todos sabem que no Rio de Janeiro a diminuição da letalidade violenta é o principal fator para que um policial seja premiado no Sistema Integrado de Metas". O secretário disse ainda que a Anistia não reconheceu os avanços."Sabemos que no Rio ainda há áreas com guerra, mas é inegável a melhora nos índices de criminalidade de 2007 para cá. Além reduzirmos o uso de fuzis e de munição, criamos o Centro de Formação do Uso Progressivo da Força, a Divisão de Homicídios, ou seja, a maioria das recomendações feitas nesse estudo de casos já é adotada em nosso Estado. Infelizmente, todo esse avanço não é reconhecido nesse estudo".
Acari está localizada na região da cidade do Rio mais conflagrada atualmente. Nas imediações, ficam as favelas dos complexos do Chapadão e da Pedreira que se tornaram o novo quartel general do tráfico de drogas, depois que o Complexo do Alemão foi ocupado, no final de 2010, como mostrou uma reportagem de ÉPOCA em maio passado. O relatório da Anistia reconhece que em áreas com Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), como é o caso do Alemão, os homicídios cometidos por policiais caíram de 136 em 2008 para 20 em 2014. As UPPs enfrentam dificuldades para pacificar morros e sofrem uma crise de credibilidade entre os moradores, mas não se pode negar que os confrontos com bandidos diminuíram, preservando vidas. O palco de guerra se deslocou para a região de Chapadão.
Dados do Instituto de Segurança Pública mostram que, no primeiro semestre de 2015 em comparação com o mesmo período de 2014, ocorreu uma alta de 21% nos homicídios decorrentes de intervenção policial no Estado. Na região de Acari e Chapadão, ocorreram 41 mortes no semestre passado, o que representa 24% do total de 171 registradas na cidade do Rio, um percentual semelhante ao verificado pela Anistia em 2014. O número de mortes causadas pela polícia também aumentou na Baixada Fluminense, principalmente no município de Belford Roxo, outra região de destino das quadrilhas de traficantes desalojadas em favelas com UPPs.
A "guerra às drogas" é uma batalha há muito tempo perdida, diz a Anistia Internacional, que pede mais rigor, dos governos estadual e federal e do Ministério Público, na apuração dos homicídios cometidos por policiais, além de assistência às famílias das vitimas. O relatório não apresenta, porém, uma alternativa à "guerra às drogas" e não leva em consideração o poder bélico dos traficantes, que também abrem fogo nas favelas sem preocupação com os moradores. Entre janeiro e maio de 2015, a Secretaria de Segurança Pública apreendeu 174 fuzis, armamento de guerra, ou seja, mais de um por dia; 51% a mais do que no mesmo período de 2014. Em média, as polícias apreendem dez pistolas diariamente e dez metralhadores ou submetralhadoras por mês. Nessa guerra, a trégua precisa alcançar os dois lados.
Fonte: Revista Época
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