21.12.2014 -
Nomeado por Bento XVI como prefeito do supremo tribunal da Assinatura Apostólica, um dicastério da cúria romana, o cardeal americano Raymond Burke foi retirado dessa missão por Francisco, e nomeado capelão da ordem de Malta. Fato raríssimo na Igreja, ele ousou criticar publicamente o método seguido pelo papa durante o sínodo sobre a família.
Fonte: Jean-Marie Guénois – Le Figaro
Le Figaro Magazine: Um cardeal pode discordar do papa?
Cardeal Burke: Certamente é possível a um cardeal discordar do papa sobre questões de procedimento ou de linha pastoral. Mas, por outro lado, é impossível divergir sobre uma questão doutrinal e de disciplina da Igreja. Assim, isso significa que um cardeal, em certas situações, tem o dever de dizer o que ele pensa de verdade ao papa. Certamente, ele deve sempre se expressar de modo respeitoso, pois o papa representa a cátedra petrina. Mas se o papa dispõe de cardeais em torno dele, é precisamente para lhe dar conselhos.
Le Figaro Magazine: As divergências constatadas durante o sínodo sobre a família tomaram demasiada importância?
Cardeal Burke: O que é estranho nessa questão dos divorciados recasados é que aqueles que recordaram e sustentaram o que a Igreja latina sempre ensinou foram acusados de serem contra o Santo Padre e não estarem em harmonia com a Igreja…Isso é um cúmulo! Dito isso, a Igreja sempre conheceu disputas teológicas e fortes confrontos onde os teólogos e cardeais foram levados a dar sua opinião. Logo, se publiquei com outros cardeais um estudo sobre esse tema para expressar minha posição, foi no espírito de alimentar uma verdadeira discussão teológica e chegar à verdade.
Le Figaro Magazine: O senhor ficou chocado com o que ocorreu no sínodo?
Cardeal Burke: O sínodo foi uma experiência difícil. Houve uma linha, a do cardeal Kasper, poderia-se dizer, atrás da qual se colocaram aqueles que tinham em mãos a direção do sínodo. De fato, o documento intermediário parecia já ter sido escrito antes das intervenções dos padres sinodais! E segundo uma linha única, em favor da posição do cardeal Kasper… Também introduziram a questão homossexual, que não tem nada a ver com a questão do matrimônio, buscando aí elementos positivos. Outro ponto muito perturbador: o texto intermediário não fazia referência nem às Escrituras, nem à tradição da Igreja, nem ao ensinamento de João Paulo II sobre o amor conjugal. Logo, foi muito desconcertante. Assim como o fato de ter mantido, no relatório final, certos parágrafos sobre a homossexualidade e sobre os divorciados recasados que não foram, todavia, adotados pela maioria requerida pelos bispos.
Le Figaro Magazine: Qual é a questão do que se tornou uma polêmica?
Cardeal Burke: Numa época cheia de confusão, como se vê com a teoria do gênero, necessitamos do ensino da Igreja sobre o matrimônio. Ora, somos, ao contrário, levados numa direção que visa admitir pessoas divorciadas e recasadas à comunhão. Sem contar essa obsessão em reduzir os processos de anulação do laço do matrimônio. Tudo isso vai conduzir de fato a um tipo de “divórcio católico” e ao enfraquecimento da indissolubilidade do matrimônio, cujo princípio é, todavia, reafirmado. Contudo, a Igreja deve defender o matrimônio, não enfraquecê-lo. A indissolubilidade do matrimônio não é uma penitência nem um sofrimento. É uma grande beleza para aqueles que o vivem, é uma fonte de alegria. Logo, estou muito preocupado, e chamo os católicos, os leigos, sacerdotes e bispos a se comprometerem, daqui até a próxima assembleia sinodal, a fim de realçar a verdade sobre o matrimônio.
Fonte: Dominus Est e www.rainhamaria.com.br
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