Artigo do Bispo Dom Antonio Rossi Keller: Levanta-te! (1 Reis 19, 5c)


11.08.2012 - A narração da 1ª Leitura deste domingo, tirada do 1º Livro dos Reis é sumamente cuidadosa e cheia de detalhes. Para começar, as alusões ao deserto, aos antepassados, aos 40 dias e às 40 noites de caminhada, ao alimento, ao monte de Deus, são muito claras e numerosas para não se reconhecer nelas o caminho inverso ao que realizou Israel no êxodo. Não se trata apenas de uma fuga; também há uma busca das raízes que terminará num encontro com Deus. Também os grandes heróis como Elias e Moisés (cf. Números 11, 15) experimentaram a nossa fraqueza. Elias, desanimado com o resultado do seu ministério, foge porque «não é melhor que seus antepassados» no trabalho pelo reino de Deus e pensa ser melhor reunir-se com eles na tumba (v. 4).
Quando o homem reconhece a sua fraqueza, então a força de Deus intervém (cf. 2 Coríntios 12, 5-9). Com o pão e a água, símbolos do antigo êxodo, Elias realiza o seu próprio êxodo (simbolizado nos 40 dias, v. 8) e vai ao encontro de Deus. Tal como é narrado, este episódio de Elias fala-nos do caminho, dos esforços, das tarefas demasiado grandes para realizá-las com as próprias forças e da necessidade de caminharmos apoiados nas forças do alimento que nos mantém. Só assim nos poderemos erguer e seguir a ordem do Senhor: «Levanta-te!»

A segunda leitura é a continuação da exortação apostólica de São Paulo que desce a detalhes, falando daquilo que o cristão deve evitar (aspecto negativo) ou deve fazer (aspecto positivo). Assim, os cristãos podem trabalhar na edificação da igreja e não entristecer o Espírito, rompendo a unidade (4, 25-32a; 4, 3). Este modo de viver encontra o seu fundamento naquilo que Cristo realizou ou o Pai cumpriu por Cristo. Devemos viver de maneira cristã e viver no amor como Cristo e o Pai (cf. Mateus 5, 48). Como o Pai perdoa, assim devemos fazer nós, cristãos (v. 32b; Mateus 6, 12. 14-15). Como Cristo ama e se dá em sacrifício, assim fazemos. A unidade é fruto do sacrifício pessoal. O tema da imitação de Deus, revela a referência evangélica desta exortação aos Efésios (cf. Mateus 4, 43-48). O Espírito é o elemento determinante do comportamento cristão. Na mesma linha, com outras passagens paulinas sobre o Espírito, a sua recepção é vinculada (indiretamente) ao batismo e considerada como selo/marca que identificará na parusia (segunda vinda de Jesus) os que pertencem a Cristo.
Quando o evangelho de João foi escrito, os cristãos já tinham sido expulsos da sinagoga. Existia um áspero confronto entre os setores majoritários judeus da diáspora e os cristãos provenientes do paganismo e do judaísmo. Pagãos e judeus ridicularizavam as expressões de fé cristã, como a eucaristia. Pareciam-lhes ritos esquisitos e contraditórios. Para os pagãos, romanos e gregos, a comunidade cristã era vista como um grupo de pretensiosos que queriam anunciar como boa notícia a morte de um carpinteiro anônimo e pobre. Para eles, as boas notícias vinham somente do imperador e das autoridades que alegravam a seus súbditos com algum presente. Para os judeus, Jesus era somente um profeta insignificante, filho de um artesão e oriundo de uma aldeia miserável. Para nenhum dos grupos, Jesus podia ser «o pão descido do céu».

As comunidades cristãs tiveram, desde o início, de se firmar muito bem para defender com energia e convicção o significado de Jesus para a história da humanidade. A salvação não somente provinha dos judeus, mas também da gente pobre da Galileia que tinha descoberto, em Jesus, o seu redentor. Jesus é o pão descido do céu porque é capaz de comunicar essa vida em plenitude que vem somente de Deus. Jesus é o caminho para uma humanidade fraterna, onde todos se reconhecem iguais e filhos da mesma família.
É oportuno perguntarmos: a forma pela qual vivemos o nosso cristianismo realmente nos compromete com o anúncio do Evangelho? Esforçamo-nos para que nossas comunidades sejam realmente igrejas vivas onde todos se reconheçam como irmãos? Criamos formas de participação que permitam a todas as pessoas expressar seu parecer e intervir plenamente na vida da comunidade cristã?

Jesus vai dar a sua «carne» («o pão que Eu hei de dar é a minha carne» – v. 51) para que os homens tenham acesso a essa vida plena, total, definitiva. Jesus estará aqui a referir-se à sua «carne» física? Não. A «carne» de Jesus é a sua pessoa – essa pessoa que os discípulos conhecem e que se lhes manifesta, todos os dias, em gestos concretos de amor, de bondade, de solicitude, de misericórdia. Essa «pessoa» revela-lhes o caminho para a vida verdadeira: nas atitudes, nas palavras de Jesus, manifesta-se historicamente ao mundo o Deus que ama os homens e que os convida, através de gestos concretos, a fazer da vida um dom e um serviço de amor.

Dom Antonio Carlos Rossi Keller
Bispo de Frederico Westphalen RS

Fonte: http://encontrocomobispo.blogspot.com.br

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