31.07.2011 - O nosso mundo, não obstante transcorridos dois milênios de anúncio da Boa Nova de Jesus Cristo, ainda tem fome de Deus. Esta fome é maior do que a fome material, pois esta só Jesus Cristo poderá saciá-la. E neste domingo as leituras vêm expressarem precisamente isso: todos têm direito à Palavra de Jesus Cristo.
Na primeira leitura o profeta, falando aos exilados de seu tempo que estavam sem esperança e sem fé, recorda as palavras do Senhor, convite sempre ressoante e vivo, que dirige-se a todos os povos: “Vinde às águas; vós que não tendes dinheiro, apressai-vos, vinde e comei, vinde comprar sem dinheiro” (Is 55, 1). Este convite tão sedutor é uma ação de complacência da parte de Deus para nós pecadores. Numa sociedade predominantemente capitalista, onde quem tem não se contenta com o que tem, mas sempre quer mais, e quem não tem quer ter mas está impedido pela ganância dos mais ricos, este convite deveria arrastar multidões, sobretudo os que, de forma sedenta, buscam um lugar para saciar-se. A todos, ricos ou pobres, o Senhor dirige-se com proeminente benevolência: “Por que gastar dinheiro com outra coisa que não o pão, desperdiçar o salário senão com a satisfação completa? Ouvi-me com atenção” (v. 2). O mundo é autossuficiente, prepotente e acha que pode progredir e sustentar-se sozinho; crê que fechando os olhos à fé, a ciência poderá dar-lhe todo o progresso necessário, e isto já bastar-lhes-ia. No entanto é bem sabido o caráter ambivalente que ela possui, pois, se por um lado é verdade que a ciência trouxe importantes e cruciais avanços para o melhor bem estar dos povos (e a Igreja não se opõe a isso), por outro é verdade também que ela trouxe consigo, em certos âmbitos, aspectos consideráveis de ignorância e de mediocridade ateístas, fazendo-se valer da fé, em certos momentos, para depois ignorá-la, ou mesmo esquecendo que toda a sua formação e constituição fora iniciada na Igreja por monges ou padres, por Bispos e até mesmo por Papas. Desta forma, ignorando suas raízes e com um execrável ódio pela Igreja, ela quer sobrepor-se mesmo sobre a fé, que pode explicar aquilo que ela, em sua capacidade limitada de inteligibilidade, não o pode. Desta forma, a ciência e fé como “irmãs” devem caminhar juntas, de maneira que venham constituir as “duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade” (João Paulo II, Carta Encíclica Fides et Ratio).
Na segunda leitura o apóstolo irá reconfortar-nos sobre a nossa unidade ao amor de Cristo. É preciso estarmos sob a intrínseca proteção deste amor que nos conforta em todas as dificuldades. Só quem se põe sob o auxilio de Cristo conhece o verdadeiro amor; só quem reconhece em Cristo o Amor pode transmiti-lo a outros. Como nos é sabido, Paulo fora perseguidor ferrenho da Igreja primitiva, não obstante o Senhor o chama a segui-lo, a testemunhar com sua vida o Evangelho e, por conseguinte, a sofrer o martírio por aquilo, ou melhor, por Aquele que anunciara.
“Quis nos separabit a caritate Christi? – Quem nos separará do amor de Cristo” (Rm 8, 35). Quem poderia, Paulo, separar-vos do Amor de Cristo se fora Ele mesmo que te uniu a Ele. Assim, com tão excelso vínculo, nem mesmo as enumeradas situações descritas poderiam fazê-lo, pois não teriam força nenhum perante um vínculo tão estreito e tão gracioso: “Tribulatio an angustia an persecutio an fames an nuditas an periculum an gladius… Neque mors neque vita neque angeli neque principatus neque instantia neque futura neque virtutes neque altitudo neque profundum neque alia quaelibet criatura – Tribulação, angústia, perseguição, fome, nudez, perigo, espada… Nem a vida, nem os anjos, nem os poderes celestiais, nem o presente, nem o futuro, nem as forças cósmicas, nem a altura, nem a profundeza, nem outra criatura qualquer” (Idem 35. 38-39). Nada, nada separar-nos-á deste amor. Sabemos que a Carta aos Romanos é sim de autenticidade paulina, e disto nenhum biblista duvida. Porém encontramos uma coincidência notória neste trecho. Paulo dirige-se aos romanos e afirma que nem mesmo a espada poderia separar-nos do amor de Cristo, e sabemos que Paulo, tendo sido degolado, o fora em Roma, onde a poucos anos dirigiu-se aos seus habitantes.
E aqui chegamos a centralidade desta segunda leitura: O que é precisamente o Amor de Cristo? Como ele se manifesta? O Cristianismo é a religião do Amor Encarnado, que expressa-se sobretudo pelo sacrifício cruento de Cristo, que de livre vontade doa a sua vida pela salvação do mundo. Assim, com este gesto, o amor encontra sua expressão máxima na pessoa de Jesus e nos indica claramente que, além de doação gratuita, o amor é também levar ao cumprimento o projeto salvífico de Deus vivenciado na radicalidade do Evangelho. O amor de Cristo não subtrai-se mediante as provações e perseguições, mas revigora-se e permeia os mais duros corações, além de ser sustentado pela constante certeza da ressurreição.
Um segundo aspecto deste amor, pelo que não irei alongar-me para que possamos chegar de imediato ao Evangelho, é o amor ao próximo prescrito entre o novo mandamento deixado por Jesus: “Ut diligatis invicem, sicut dilexi vos – Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 15,12). Para alguns o amor em Platão era alheio a interesses ou gozos, era uma virtude. Na verdade, porém, olhando a fundo o pensamento de Platão, vemos que ele concebia o amor como faltoso, ou seja, não pode completar-se, mas busca no amado a Ideia que não possui em si. Destas duas formas podemos conceber o amor cristão. A primeira é a forma do amor ao próximo, que deve ser gratuito, como Cristo ensinara: Amar sem interesse, amar por amar; amar por que Ele, Amor verdadeiro, amou. A segunda é o amor a Deus: O ser humano em sua condição limitada é um ser faltoso. Não é um ser plenamente “autônomo”, mas depende de Deus, que lhe dá vida, que o sustenta e o criou. Quem busca a plenitude da felicidade e uma realização total com os seres limitados e finitos e esquece-se de correr a Deus nunca poderá sentir-se plenamente realizado, pois só Deus realiza plenamente o homem.
Na sua primeira Encíclica Deus Caritas est, o Santo Padre Bento XVI, de feliz reinado, evidencia isso ao afirmar: “O amor ao próximo é uma estrada para encontrar também a Deus, e que o fechar os olhos diante do próximo torna-os cegos diante de Deus” (n. 16).
No Santo Evangelho somos hoje convidados a meditar sobre a multiplicação dos pães. A intenção de Jesus era estar só, por isso retira-se a um lugar deserto e afastado, porém o povo o segue, mas segue para ouvi-lo sem saber o que depois haveria de suceder-se. O alimento que buscavam não era alimento material, queriam alimentar-se espiritualmente, estavam sedentos de respostas. Recordemo-nos que no famoso discurso do Pão da Vida se dirigem até Jesus pessoas interessadas apenas no pão material que viram do milagre da multiplicação feito.
Agora Nosso Senhor toma a iniciativa e faz o milagre, pois o povo não fora na intenção de comer, mas de escutar as palavras de vida eterna. Jesus então, vendo o quanto a multidão, que só homens eram cinco mil, sem contar mulheres e crianças, estavam fatigados por tantas horas expostos ao sol para escutá-lo, Jesus realiza então o gesto de multiplicação. Se antes procuraram a Jesus para que lhes desse pão de graça e Ele não no-lo deu, agora Ele concede pão aos que foram ouvi-lo, mas o concede porque antes de tudo foram em busca do Reino de Deus, e o resto viera em acréscimo (cf Mt 6,33). Aqui dois esclarecimentos viriam a ajudar-nos. Primeiro: Por que o evangelista só cita o número de homens, mas não o de mulheres e crianças? Porque somente os homens eram os reais seguidores da Lei. Mulheres e crianças eram deixados à margem desta aprendizagem. A segunda observação é: O milagre de Jesus é já uma prefiguração de sua doação na Eucaristia, não uma mera apologia a partilha, mas é um milagre, manifestação da divindade de Jesus, para que todos reconhecem nele a imagem por excelência de Deus.
Por fim, peçamos a Maria Santíssima que interceda por nós e que sejamos sempre mais fortalecidos para corremos ás fontes e saciar-nos do Deus que é pão da vida.
Fonte: http://beinbetter.wordpress.com/
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