06.03.2011 - Descobri no fim desta última semana, alegrando-me com alguns colegas no colégio, que gosto do Carnaval. Dançávamos e gargalhávamos ao som de umas boas marchinhas. Comecei batendo palmas e, no fim, me vi imitando uma locomotiva enquanto julgavam a personalidade de Zezé, o cara da longa cabeleira, enquanto me pediam dinheiro, dizendo que iam fazer, por isso, uma grande confusão. Posso dizer – de verdade – que me diverti.
No entanto, eu enganaria não só a mim mesmo, mas também aos meus leitores, se dissesse que o que apreciei é o mesmo que as pessoas hoje entendem como Carnaval. Gosto das marchinhas, das risadas com os amigos; rejeito a permissividade das músicas apelativas que vêm sendo tocadas nos eventos carnavalescos modernos, a indecência dos trajes imodestos que vêm sendo usados pelos foliões, a embriaguez na qual muitíssimos acabam por cair e todas esses outros fatores que fazem de uma festa divertida um festival de permissivismo sexual e perversão dos costumes. Se sempre temos em mente que nossas atitudes não devem ser motivo de escândalo para o nosso irmão católico; se lembramos que, perto daqueles que não têm Fé, nossas palavras e ações podem levar o outro a um encontro real e íntimo com nosso Senhor; se conservamos, enfim, na memória, a importância de amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos, divertir-se se torna uma prática agradavelmente sadia.
E o chamado à alegria está nas próprias Escrituras. Os Salmos lançam um alegrai-vos por mais de três vezes (cf. Sl 31, 11; 68, 33; 96, 12; 97, 4); o profeta Joel manda que o povo judeu dê graças ao Altíssimo pelas chuvas que manda “no tempo oportuno” (cf. Jl 2, 23); o próprio Jesus manda que os justos perseguidos se alegrem, porque será grande sua recompensa nos céus (cf. Mt 5, 12); São Paulo, na mesma linha, enche sua carta aos cristãos filipenses com veementes recomendações: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Repito: alegrai-vos!” (Fp 4, 4) E o primeiro Papa, São Pedro, incita os fiéis a alegrarem-se “em ser participantes dos sofrimentos de Cristo, para que vos possais alegrar e exultar no dia em que for manifestada sua glória” (1 Pd 4, 13). É verdade que nem sempre os católicos se entretêm, neste período, na participação de retiros espirituais ou festas promovidas por algum órgão religioso, mas essa alegria que nos convida a dançar, a cantar, a festejar com os amigos deriva justamente da felicidade de estar em estado de graça, de estar em comunhão com o Senhor. Em suma, sem essa alegria interior e sobrenatural dificilmente poderemos nos divertir de modo genuíno na festa de Carnaval. O sorriso e o prazer de estar entre amigos não podem satisfazer os anseios mais profundos da nossa alma, por mais entusiasmantes que pareçam.
Aqui talvez esteja o grande ponto de divergência entre os cristãos e aqueles que são do mundo. É inegável que ambos têm uma sede profunda de transcendência, de infinito, sede que só pode ser verdadeiramente saciada por Deus. No entanto, enquanto os mundanos gozam das coisas desse mundo buscando-as como fim, exaltando o prazer, a matéria, a carne, a ponto de se esquecerem de sua alma imortal, os cristãos, colocando a realidade sobrenatural acima de tudo aquilo que aí está, pondo sua esperança de salvação no Eterno, fazem o que aconselhou o Apóstolo: “O que importa é que os que têm mulher vivam como se a não tivessem; os que choram, como se não chorassem; os que se alegram, como se não se alegrassem; os que compram, como se não possuíssem; os que usam deste mundo, como se dele não usassem. Porque a figura deste mundo passa” (1 Cor 7, 29-31). Os seguidores de Cristo estão atentos àquilo que exortava o discípulo amado: “O mundo passa com as suas concupiscências, mas quem cumpre a vontade de Deus permanece eternamente” (1 Jo 2, 17).
Então, neste Carnaval, divirtamo-nos sim, mas com respeito, discrição e obediência à vontade de Deus. Nada de puritanismo, mas também nada de entregar-se aos prazeres da carne, colocando a vida de nossa alma em risco de cair no fogo eterno.
Para uma melhor compreensão do pensamento cristão sobre o Carnaval, recomendo a leitura de um artigo do pe. Françoá Costa, publicado no site Presbíteros, no qual ele fala da virtude da eutrapelia. “O ócio também é educativo quando bem vivido. Já Santo Tomás de Aquino, e antes dele Aristóteles, falava da virtude que põe o justo meio entre a relaxação no lúdico e a seriedade excessiva”. Também indico a leitura dos textos recém-publicados pelo Jorge Ferraz, no Deus lo Vult!. No primeiro ele explica o problema do puritano que condena o Carnaval como sendo uma festa intrinsecamente má. “Demonizar completamente a idéia de que é possível alegrar-se e divertir-se nos dias do carnaval é a melhor maneira de afastar as pessoas da Igreja e perdê-las para as imoralidades carnavalescas.” No segundo ele fala da comemoração contextualizando-a com a chegada da Quaresma. “Se a Igreja nos convida a um tempo de maiores exigências, é algo profundamente humano aproveitar os últimos brilhos do tempo onde somos menos cobrados.”
Um feliz e santo Carnaval a todos!
Graça e paz.
Salve Maria Santíssima!
Fonte: http://beinbetter.wordpress.com
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